<p>Quando se observa ao espelho, o Partido Social Democrata verá uma organização plural, com bases e elites, urbanos, rurais, liberais e sociais-democratas. Mas a realidade é bem distinta. Esse partido já não existe e a sua herança está a ser espartilhada pelos que se acham herdeiros das elites, numa manifesta arrogância intelectual; mas também pelos que se julgam condutores das bases. Os actuais dirigentes não representam nem uns nem outros, mas tão-só a si mesmos: de um lado, os gestores de grandes negócios e, do outro, os caciques, detentores de pequenos poderes.</p>
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A Comissão Política Nacional está por ora entregue à tendência lisboeta e cortesã, a quem Luís Filipe Menezes cedeu o poder de mão beijada. Os actuais dirigentes, "elitistas" estão ligados à finança, a famosos escritórios de advogados e constituem, com os seus parceiros do Partido Socialista, o bloco central de interesses. Controlam os grandes negócios do Estado, desde a construção do comboio de alta velocidade aos investimentos protegidos, designados de interesse nacional, passando pelos projectos do ambiente ou auto-estradas. Comem à mesa do orçamento e o partido é apenas mais uma das muitas plataformas em que desenvolvem a sua actividade empresarial. Sobreviveram à condenação no escândalo de financiamento partidário "Somague" e nada parece limitar a sua gula.
Do outro lado do espelho, os pequenos poderes pensam reflectir-se nas bases. Emergem sobretudo na província e vão desde um licenciamento de favor obtido numa câmara municipal, à atribuição de empregos a militantes do partido, passando pela adjudicação de obras a preços inflacionados aos empreiteiros locais. A oferta de jantaradas e electrodomésticos em campanha eleitoral é ainda a marca destes políticos, que não se mostram inquietados pelas constantes ameaças de perda de mandato ou de prisão.
Entregue a estes directórios, o PSD, desnorteado e sem causas, caminha a passos largos para o abismo. Para sobreviver, tem pois de reconquistar verdadeiras elites, motivar bases genuínas. Elites que debatam doutrina política e apontem estratégias de desenvolvimento para Portugal; e bases que a elas adiram e contagiem outros com a causa social-democrata. Foi esta a vocação original do PSD. O partido não tem obrigação de ganhar eleições, mas sim de apresentar propostas de governação alternativa, fiéis à sua matriz doutrinária. É o que distingue um partido democrático dum simples bando de assalto ao Poder.