Os governos governam para as pessoas. Tese número um. Mas os governos também governam para os governos. Tese número dois.
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Sem grande esforço, podíamos invocar uma terceira versão: ocasiões em que os governos fazem o pleno. Governam para eles e para nós. Ora, ao ouvirmos o que tem sido dito sobre os novos passes nos transportes públicos ficamos com a sensação de que a discussão é sobre outra coisa qualquer e não sobre o facto de haver mais de um milhão de portugueses que, de um mês para o outro, obtiveram um ganho significativo no orçamento familiar. Nalguns casos, superior a 100 euros. Aqui imperou a tese número três, mas felizes de nós se mais vezes as necessidades dos governos e dos cidadãos fossem coincidentes. Descontada a coreografia dos ministros, o ar garboso do primeiro-ministro, o sorriso triunfal dos autarcas e a esforçada tentativa do BE e PCP para assumir a paternidade da ideia, não há outra forma de sintetizar o que foi feito: decisão acertada, justa e urgente. A mobilidade nos aglomerados urbanos é uma das questões mais desafiantes para os gestores políticos, associada ao debate sobre a sustentabilidade ecológica do planeta. Não devíamos estar a discutir se o Governo foi eleitoralista (são-no todos por definição), devíamos era estar focados em manter viva a ideia. No fundo, trabalhando no sentido de impedir que um bem-intencionado plano se transforme num pesadelo para os utentes. Porque é isso que pode acontecer se ao dinheiro investido na redução tarifária não houver um movimento simultâneo de modernização e alargamento da frota que acautele um esperado incremento na procura. Os utentes até poderão fechar os olhos durante uns meses porque estão a pagar menos, mas se os tempos de espera dispararem ou começarem a viajar em pé, a compreensão transforma-se em ira. É bom termos a noção de que no futuro vai ser preciso continuar a gastar muito dinheiro nos transportes públicos. E que o problema da mobilidade não ficou resolvido com os descontos nos passes. Mesmo que esses passes sejam mágicos.
Diretor-adjunto