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O chumbo do Tribunal Constitucional à lei dos estrangeiros era mais ou menos previsível, ainda que houvesse dúvidas sobre a sua real extensão. O Governo já o adivinhava, não apenas porque o documento fora enviado para apreciação por um dos melhores constitucionalistas do país (Marcelo Rebelo de Sousa), mas também porque o normativo, arquitetado à pressa, continha fragilidades óbvias, nomeadamente nas questões relativas ao reagrupamento familiar, ou seja, as circunstâncias em que um cidadão estrangeiro a residir em Portugal pode trazer a família nuclear para perto de si. Contudo, esta decisão não deve desviar as atenções do que sempre esteve em causa: o Governo, apoiado pelo CDS e pelo Chega, queria transmitir uma mensagem política de ordem no acolhimento dos imigrantes, porque fez dela uma bandeira eleitoral e porque faz dela uma arma de negociação no jogo de equilibrismo com o Chega. Aliás, não por acaso André Ventura reagiu à declaração de inconstitucionalidade enquadrando o problema apenas na sua dimensão securitária, ignorando a matéria de facto sobre a qual o Constitucional se deteve.
O que vai acontecer agora é simples: o Governo respeitará a decisão, fará os ajustes para tornar a lei mais polida e, provavelmente daqui a uns meses, estarão reunidas as condições para o Parlamento reapreciar uma nova versão. Até lá, há tempo para dar a este tema a dimensão que ele precisa, aprofundando o debate com as associações que representam os imigrantes e consensualizando posições partidárias. Enquanto isso, o Estado continuará a usar a seu bel-prazer o travão administrativo e informal à entrada e legalização de estrangeiros em Portugal que dá pelo nome de AIMA, Agência para a Integração, Migrações e Asilo.