1. Estar na final ou vencer-se um título europeu é a melhor coisa que pode acontecer a um clube português. Ter nível europeu é a melhor coisa que pode suceder a uma empresa. Viver-se com a qualidade de vida europeia e o Estado social europeu é a meta de todas as nações e pessoas deste Mundo. Então, porquê este desprezo pela Europa, tanta abstenção nas eleições europeias, tanto "nacionalismo"?
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O futebol é sempre um tema muito mal-amado pelas elites mas é o melhor caso de como em redor de uma bola se pode criar uma ideia de Europa. Imagine-se o clima de tensão/ódio quando os clubes alemães disputavam os jogos das competições europeias contra clubes franceses ou ingleses. Poucos anos antes os seus países tinham-se destruído mutuamente, a Europa era um território devastado. Mas foi possível unir os países. Como dizia José Cutileiro no sempre indispensável Visão Global, aos domingos (12h) na Antena 1, foi a ameaça "Estaline" que uniu os europeus - por muito ressentimento que existisse contra os alemães.
A União Europeia de hoje é uma organização imperfeitamente extraordinária mas tanto mais importante quanto o Mundo se torna caótico. Verificamos, se estivermos de boa-fé, o paraíso civilizacional que é viver num território militarmente inquestionável, com o mercado comum de maior poder de compra per capita do Mundo, níveis de saúde e longevidade imbatíveis a qualquer escala e, ainda por cima, paradigmas culturais e ambientais seguidos mais tarde ou mais cedo por todos os outros blocos geoestratégicos. Ah, e claro, a mão de obra mais qualificada do planeta.
É injusta e defeituosa na arquitetura do euro? Claro que sim. Mas não se pode destruir um projeto porque não atingiu ainda a perfeição. Quando se ouve na campanha eleitoral os lugares comuns sobre a "injustiça" europeia versus o paraíso nacional, recuamos ao parque jurássico da política. Porque, na prática, creio que a maioria dos portugueses gostam de ser europeus (apesar da troika e dos seus imensos erros), preferem não ter fronteiras e até agir numa economia mais desafiante mas com uma moeda única.
2. Mas estas eleições têm ainda uma outra utilidade: é que podem ajudar a clarificar a política nacional sem pôr em causa a política europeia. Há muitos e bons pequenos partidos que nos podem ajudar a dar um cartão amarelo (ou vermelho) aos chefes do sistema e ajudar a que a democracia portuguesa seja respirável.
Basta olhar para o esmagamento da comunicação dos grandes partidos nas televisões, rádios e jornais, para se perceber quão difícil é aos pequenos partidos darem-se a conhecer. E no entanto vale a pena ler-se as propostas e ideias de Marinho e Pinto, pelo MPT, as ideias fora da agenda comum do PAN ou o projeto com pés e cabeça para a Europa do novo partido Livre, do Rui Tavares.
Conheço o Rui Tavares há alguns anos, tive a possibilidade de trabalhar e conhecer por dentro as ideias dos Verdes europeus para uma Europa do Sul e seria extraordinário dar a oportunidade ao Rui de repetir um mandato na Europa onde muitas causas portuguesas e europeias teriam (melhor) voz: crescimento económico a partir do conhecimento, renegociação das dívidas para uma concreta solidariedade europeia, ou algo tão simples mas tão complexo como criar um programa europeu contra a pobreza infantil. Tudo isto sem destruir o euro e os principais valores da democracia.
Ou seja, o Livre é um partido ligeiramente à esquerda do PS mas fora da "religião" cega e cacique dos socialistas que votam na camisola como se a política fosse futebol. Nada mais errado: António José Seguro não ganha o país e por isso não é capaz de levar o PS à maioria absoluta em 2015 - gerando um impasse que manterá o PSD no poder.
Em simultâneo, quem acha que a Europa não interessa, olhe para a Ucrânia. O que temos, hoje, não é muito bom. E não é tempo para ódios. É tempo de tentarmos ser muito melhores na Europa para sobrevivermos aos colossos não democráticos, sejam eles a arrogância russa, o capitalismo selvagem chinês ou o fanatismo islâmico. Viver nesta Europa é (apesar de tudo) a melhor coisa que pode acontecer a qualquer pessoa que abra os olhos no planeta azul.