Assistimos ao apelo público de autarcas e deputados no sentido de evitar a perda de serviços associados a estações de Correio, com o presidente dos CTT, em simultâneo, a dar uma entrevista ao "Expresso" em que afirma exatamente o contrário, não só na qualidade como na quantidade de serviços oferecidos.
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Seguramente que os tempos são hoje diferentes dos narrados no século XIX por Júlio Dinis em a "Morgadinha dos canaviais", quando descreve com detalhe a "animada cena da chegada do correio e sua distribuição numa pequena aldeia. Durante a leitura dos sobrescritos, feita em voz alta pelo empregado respetivo. Que hora de comoções quando se abrem as malas! Nas grandes cidades dispersam-se estas comoções". Sendo distintos os dias de hoje, não deixa de ser verdade, porém, que os serviços de correio continuam a ser dos que geram um sentimento de maior proximidade com os utentes, em especial quando estes estão em zonas de menor densidade demográfica.
Por isso fico confuso quando colocado perante questões concretas como as do avanço dos municípios do Douro com uma providência cautelar contra os CTT, da população de Belmonte na rua, de Arraiolos contra o encerramento ou autarquias contra o fecho de estações, o seu presidente afirma que "a principal coisa que os CTT têm de fazer é comunicar. A empresa não abandona as populações nem as localidades". Ou ainda que "aflige-me não conseguir comunicar às pessoas que todos os serviços a que tinham acesso continuam a ser assegurados, muitas vezes no mesmo sítio, mas com outro modelo, ou a algumas centenas de metros de distância". Mas fico apreensivo, para não dizer desconfiado, quando a mesma pessoa se queixa do aumento do número de indicadores de medida dos objetivos de desempenho, tornando os mesmos difíceis de cumprir. Porque claramente o que vemos são estações a fechar, sem que nada aconteça ao lado, muitas vezes sem haver sequer o cuidado de limpar os espaços que passam a ficar ao abandono.
Temos assim um problema nesta questão dos CTT, em que nos sentimos incapazes de perceber a melhoria qualitativa e quantitativa que nos apregoam. Porque mesmo para os bem-aventurados, que não precisam de ver para crer, a fé torna-se cada vez mais difícil de manter.
* PROFESSOR CATEDRÁTICO, VICE-REITOR DA UTAD