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Não é todos os dias que os presidentes de sete grandes bancos portugueses, ou a operar em Portugal, se sentam na primeira fila de uma sala para ouvir o primeiro-ministro falar de habitação social. Normalmente, um tão composto ramalhete só é visto quando os "negócios" são de outra monta. O que explica, então, esta exceção à regra? Duas coisas.
Primeira: este é, porventura, o primeiro sinal público de que a Banca percebeu, finalmente, a absoluta necessidade, tantas vezes reclamada pelo Governo, de fazer parte da solução, injetando na economia (neste caso, na economia social) os milhões necessários para ir desfazendo o mal que corrói o país e aumenta o passivo dos bancos.
O mérito cabe a Pedro Mota Soares, ministro da Solidariedade, e ao secretário de Estado Marco António Costa, que souberam montar uma operação capaz de ser, ao mesmo tempo, uma almofada social para os mais necessitados e um negócio interessante para os bancos.
Basicamente, o programa de arrendamento social disponibiliza, para já, 729 apartamentos com rendas 30% abaixo do preço de mercado. A entrega faz-se sem as loucuras de outros tempos: só famílias com taxas de esforço entre 10% e 30% podem aceder às casas disponíveis. Ou seja: um agregado que ganhe 1000 euros só pode pagar entre 100 a 300 euros de aluguer. Em 2013, é suposto existirem cerca de duas mil habitações neste mercado.
Segundo motivo para a presença em massa dos banqueiros. Este é um negócio que vai de encontro a um dos principais problemas da Banca: por falta de capacidade financeira do comprador há, todos os dias, 23 casas que são entregues aos bancos que concederam empréstimos para a aquisição dos imóveis. Problema: não há sinal de o fenómeno poder regredir nos próximos anos. Problema maior: os bancos não querem ser proprietários de imóveis, porque não vivem disso.
De modo que, ainda que numa pequena mas crescente escala, a colocação de casas no mercado, mesmo a preços controlados, interessa aos banqueiros. E interessa, sobretudo, a quem não tem outra oportunidade de arranjar um teto que não seja esta.
Mais: as autarquias, a quem cabe a primeira avaliação das candidaturas, também fazem parte desta rede. O que faz todo o sentido, porque a proximidade é um elemento decisivo para ajudar quem mais precisa.
Deste exemplo resulta uma constatação, evidente mas raras vezes posta em prática num país em que as partes começam por desconfiar bem antes de confiar. O velhinho adágio segundo o qual só "a união faz a força" tem hoje um valor acrescido. Até porque, como mostra à saciedade o nosso esbanjador passado, "o dinheiro não cai do céu". Os banqueiros sabem disso. As famílias também.