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Conheci, no início dos anos 80, Francisco Pinto Balsemão. Tinha acompanhado a sua ação política como cabeça de lista do PSD pelo círculo eleitoral do Porto. Para mim, ele tinha sido um dos símbolos da ala liberal, no antigo regime, e apareceu sempre como alguém com um perfil que afirmava o PPD/PSD como um partido de centro-esquerda. Após a morte de Francisco Sá Carneiro, assume a liderança do PSD e, por força das circunstâncias, da AD e do Governo.
Desde logo, compreendi que a sua vida política não iria ser fácil. Apesar de ser dono de um jornal com prestígio, de se viver num país a preto e branco na televisão, um jornal com o nome "Tempo", já desaparecido, ia dando guarida a alguns dos seus adversários no PSD. Costumavam dizer que Balsemão, no Conselho Nacional, ia de vitória em vitória até à derrota final. Este vaticínio iria ser certeiro, mas também injusto. Como governante, Balsemão acabou por deixar ao país um conjunto de reformas decisivas.
Fez a revisão constitucional de 1982 que devolveu os militares aos quartéis e acabou com o Conselho da Revolução. O modelo de sistema político semipresidencialista, de pendor parlamentar, afirmou-se, apesar da oposição do então presidente da República, Ramalho Eanes. Promoveu, em 1982, o primeiro Código Penal da democracia. Fez aprovar o primeiro estatuto das instituições particulares de solidariedade social, em 1983, e, dessa forma, ajudou a pacificar um setor que o PREC tinha procurado desmantelar.
Procurou acelerar a implementação da regionalização do território prevendo um calendário para tal e depois as circunstâncias não deixaram concluir. Ajudou no Norte à navegabilidade do rio Douro, nomeando Paulo Valada para liderar um organismo público criado para tal. Hoje, a região sente o resultado desse trabalho, pois o rio passou a ser uma fonte de atração de turistas.
Quando saiu do Governo, após um longo e demorado período de gestão, tinha deixado o processo de adesão à Europa muito avançado. A seguir Eanes não quis dar à AD mais um governo com a liderança de Vítor Crespo. Veio então o governo do Bloco Central. Balsemão continuou a ser sempre uma referência independente na vida política portuguesa. Virou-se para a Comunicação Social e ajudou a fundar a primeira televisão privada e, dessa forma, também ajudou a mudar em muito o país.
Graças ao seu exemplo, aderi ao PSD e pude ver, muito de perto, como muitas vezes foi incompreendido. Trabalhei com ele na organização da Assembleia Magna da social-democracia, logo após o final do consulado de Cavaco Silva, com Marcelo Rebelo de Sousa na liderança do PSD.
O tempo foi-nos encontrando em muitas ocasiões. A última foi quando Rui Moreira o homenageou no Porto, a cidade com que sempre se identificou. Ele era também como um de nós, no Porto, onde podemos trocar os bês pelos vês, mas não trocamos a liberdade pela servidão.

