Um estudo da Organização Mundial de Saúde ("Health Behaviour in School-Aged Children") sobre a adolescência, envolvendo Portugal, documenta que os nossos jovens se sentem infelizes.
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A recolha destes dados é feita desde 1998 por períodos de quatro anos. Nunca como agora o agravamento da perceção de mal-estar individual foi tão significativo.
Confrontados em 2014 com a pergunta "como se sente face à vida?", 14,6 por cento dos adolescentes responderam "infeliz". Este ano, essa percentagem subiu para 27,7 por cento. Os comportamentos autolesivos do próprio corpo também afetam agora maior número de jovens. E a perceção em relação à saúde como sendo má regista igualmente uma subida. Os mais novos não estão bem. Consigo próprios e com os outros.
Relativamente à família, os resultados divulgados suscitam de igual modo grande preocupação. Verifica-se aí uma degradação significativa das relações interpessoais. Podemos viver na mesma casa, mas estamos cada vez mais longe uns dos outros. Os respondentes deste inquérito assumiram este afastamento que se nota, por exemplo, nos momentos das refeições em família, que se reduzem de forma expressiva. E nem sequer isso é compensado com outros momentos de reencontros. Neste quadro, procuram-se novos laços emocionais e, a esse nível, as redes sociais vão conquistando cada vez mais tempo e atenção dos mais novos.
Saídos de um tempo pandémico que nos aprisionou durante largos meses em casa e a braços com uma inflação galopante, constatamos que não somos apenas nós, os mais velhos, que poderemos estar mal. Os mais novos não estão bem. E isso deverá suscitar a preocupação de todos: da família, da escola e dos decisores políticos.
Em casa, precisamos de investir mais tempo nos nossos filhos. Não é fácil. Depois de um dia de trabalho e com refeições para preparar e outras tarefas domésticas para realizar, quem tem, na verdade, disponibilidade para conversar calmamente? Na escola, os professores sentem todos os dias a pressão dos programas que têm para cumprir, restando pouco tempo para atender às necessidades reais de cada aluno.
Ora, é nesta conjuntura de falta de tempo que os atores políticos poderão, na verdade, fazer a diferença. Precisamos com urgência de políticas públicas que reforcem (ainda mais) a saúde mental e que atendam de forma prioritária a um curriculum alternativo que privilegie a formação emocional dos mais novos. Tão importante como as disciplinas nucleares, é vital encontrar na escola tempos para falar daquilo que consome os estudantes: as redes sociais, os medos, os sonhos... Há uma geração em agonia e isso tem de nos fazer parar, não para refletir, mas para agir. Antes que seja tarde.
*Prof. associada com agregação da UMinho