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Com a idade ganhei peso, e não apenas o medido pela balança. Também passei a pesar melhor as consequências dos atos - dos meus e dos outros. Apesar de aos 30 anos não ter sido um bom social-democrata, aos 20 fui comunista (tendência trotskista IV Internacional) pelo que compreendo o sentido daquela que é a mais célebre das frases do Willy Brandt.
Compreendo isso da mesma maneira que compreendo que trabalhadores das empresas públicas de transportes, professores, polícias, militares e procuradores do Ministério Público não levem a bem perder dinheiro e privilégios.
Compreendo a revolta, mas não me peçam, por favor, que apoie ou sequer olhe com simpatia para greves inúteis e ineficazes que só prejudicam os outros trabalhadores, que não têm o Estado como patrão - apenas o financiam.
As greves dos transportes públicos somente prejudicam quem depende deles para ir trabalhar e estudar e os paga antecipadamente, comprando o passe social.
As greves dos procuradores e as ameaças dos juízes só degradam ainda mais a péssima imagem que temos do funcionamento e honorabilidade do sistema judicial.
As manifestações desordeiras dos polícias e GNR não só são um exemplo deplorável como nos fazem perder o resto do respeito que tínhamos pelas forças de segurança. A contestação dos militares só nos leva a interrogar para que serve o exército e gastar 900 milhões de euros em submarinos.
E são absolutamente ridículas as greves e manifestações dos trabalhadores dos Correios contra uma privatização que lhes vai devolver os cortes salariais, nas ajudas de custo, remunerações de trabalho extra e noturno impostos pelas regras da austeridade no setor público.
Em 2012, não se passou nenhum dia sem uma qualquer paralisação no setor público e este ano vamos pelo mesmo caminho, apesar de isso não contribuir para a felicidade de ninguém. Antes pelo contrário.
Dantes não era assim. Temendo o seu peso eleitoral, os governos escolhiam o caminho fácil de tentar comprar o voto dos funcionários públicos aumentando-os generosamente. E com medo da insatisfação da população provocada pelas greves nos transportes, cediam cobardemente à pressão sindical.
O problema é que agora nem este nem nenhum outro Governo tem margem para calar a agitação com cedências. Não há dinheiro. E o que tem de ser tem muita força.
Os tempos mudaram e os sindicatos e trabalhadores do setor público não perceberam e por isso ficaram fora de moda, continuando a usar no século XXI o arsenal de formas de luta inventado quando ninguém saía à rua de cabeça descoberta, o telefone estava preso à parede por um fio e a máquina de escrever era o último grito da tecnologia.
As greves dos transportes podem ser mediáticas, mas na realidade pesam pouco num país em que 82% das pessoas nunca fizeram greve e a taxa de sindicalização (19%) é bem inferior à média europeia (24%).
Estas greves não podem ser levadas muito a sério até porque - e muito infelizmente - o exercício do direito à greve está vedado aos dois grupos que mais estão a sofrer com o ajustamento: os pensionistas e os reformados.