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O espaço público está carregado de intolerância, com profissionais do radicalismo a contagiar cidadãos outrora moderados e quem tem as maiores responsabilidades políticas faz que não vê, apenas porque não sabe como sair do beco onde nos estamos a meter. Há um exército quase infinito de pessoas disponíveis para se alistar, a começar pelos que não suportam as suas próprias fragilidades.
O debate está inflamado entre "nós" e os "outros", num disparate sem fim em que "nós" temos sempre razão e os "outros" nunca, mas os "outros" também somos "nós" vistos pelos "outros". Agora, até há as "nossas" estátuas e as estátuas dos "outros". Durou pouco, muito pouco, o tempo em que só existia "nós", porque estávamos todos juntos num combate contra um vírus que ameaçava contagiar de igual forma a raça humana, de todas as cores de pele, de todos os credos, de todas as condições sociais, de todos os quadrantes políticos.
Em 2017, quando escrevi no DN que "um partido populista de Direita estava mais próximo do que parecia", o país continuava otimista, julgando-se imune a fenómenos extremistas. Dois anos e meio depois, no dia seguinte às últimas legislativas, quando afirmei que havia "motivos para estarmos preocupados com a entrada em cena do Chega, um partido de um homem só, extremista e que não hesita em explorar os medos dos mais fracos para ter sucesso eleitoral", também houve quem continuasse a pensar que na política portuguesa não havia lugar para fantasmas. Hoje, estou certo que Portugal vai ter um problema político grave com a radicalização do debate. A influência dos antidemocratas na política quotidiana acabará por se tornar insuportável. Ter partidos do arco da governação (PSD e CDS) a afirmarem a sua disponibilidade para aceitar uma aliança com o Chega, quando o Chega vale um mísero deputado, mostra bem ao que estão dispostos estes partidos se a extrema-direita crescer e contribuir para formar uma maioria absoluta.
A Comunicação Social, que adora polémicas e, por isso, dá palco a André Ventura, noticiando todas as suas propostas e todos os seus comentários; os radicais de Esquerda, que adoram fazer dele o seu principal adversário, alimentam as redes sociais onde agora também se alimenta a Comunicação Social; os liberais e restantes democratas de Direita que, para estarem contra a Esquerda, estão permanentemente a desculpar o extremismo de Direita; a Esquerda snobe sempre a pensar que está dispensada de se adaptar ao mundo real... tudo isto somos nós!
*Jornalista