É irresistível. Mesmo para quem considera que a célebre frase do filósofo João Pinto ("prognósticos só depois do jogo") encerra um princípio de elementar prudência, a época do ano é contagiante. Se toda a gente manda uns palpites sobre o que vai acontecer em 2013, por que razão não o hei-de eu, também, fazer? Uma boa razão está, agora mesmo, escancarada na página digital do "New York Times": os políticos americanos não se entendem sobre o que fazer. A menos de 24 horas do prazo limite, as divergências parecem insuperáveis e o passo em frente, para o chamado abismo orçamental, inevitável.
Corpo do artigo
Se assim for, o aumento geral nos impostos e os cortes drásticos na despesa, nomeadamente a destinada ao apoio aos desempregados, terão consequências, para os Estados Unidos e para a economia mundial, que quase ninguém se atreve a antecipar. Por isso mesmo, quase todos os analistas admitiam que, mais cedência menos cedência, se chegaria a um acordo. Pode ser que, qual filme de suspense, tal aconteça na 25.ª hora. "Just after time" mas ainda a tempo de evitar o descalabro de uma economia que, mesmo em ritmo mais lento do que todos gostaríamos, era das poucas que ia dando sinais de vida. Não é fácil imaginar cenário pior para começar o ano do que uma recessão nos Estados Unidos. Este facto deveria, só por si, ser suficiente para percebermos que há muitas variáveis, que nós não controlamos minimamente, das quais (também) depende o nosso futuro.
Aqui chegado, tendo decidido ouvir a voz do filósofo, fui dormir na expectativa de que o sono me desse o tema para este escrito semanal. E sonhei. E o que sonhei pede meças a qualquer taróloga. Em 2013, a troika vai ser muito nossa amiga. Bem! Amiga, amiga é como quem diz. Vai achar que continuamos a ser muito diligentes e cumpridores, atentos e veneradores e, como contrapartida, vai baixar as comissões, alargar o período de carência para o reembolso do empréstimo e dar-nos mais um ano para atingirmos o objectivo do défice estrutural acordado. O Governo vai fazer de conta que até não queria mas, "já agora", aceita. Pensando bem, talvez não seja uma previsão assim tão desasada. Schäuble, o ministro alemão das Finanças, já tinha dito a Gaspar que, se fosse preciso, poderíamos contar com uma ajuda. E começa a ser preciso, para nós, e para eles, pois não há maneira de as políticas propostas gerarem um caso de sucesso.
As concessões da tríade acontecerão ainda antes de Abril, relativizando o péssimo desempenho orçamental e evitando a desagregação da coligação, iminente após a desafinação no debate sobre as funções do Estado e as consequentes reduções de despesa. Atribuídas ao prestígio e credibilidade de Vítor Gaspar, foram uma maneira de o BCE manter o seu homem de confiança no Governo, numa altura em que, no país e dentro do PSD, crescia a pressão para a sua substituição.
Até meio do ano, a economia não vai ajudar, com as exportações a patinarem e o desemprego a aumentar. Por essa altura, a economia americana terá recuperado do tropeção inicial e o crescimento do mercado interno chinês empurrará a economia mundial para um crescimento mais sustentado.
António José Seguro repetirá que as cedências da troika correspondem ao que sempre havia defendido, clamará vitória, denunciará a incompetência do Governo e a inconsequência das políticas prosseguidas, voltará a anunciar que o PS está pronto para assumir a responsabilidade de governar se o povo lha quiser atribuir e este, está bem de ver, acha que para pior já basta assim.
A Esquerda radical continuará a defender a saída deste Governo, a saída da troika, a saída do euro, uma ou várias saídas para a crise, até à saída do ano.
Por esta altura do sonho (os sonhos têm uma cronologia própria), Pedro combinava com Laura o post no facebook a propósito da Páscoa, com coelhinhos e ovos e tudo. E foi quando acordei. Os americanos continuam sem se entender. Nós, por cá, também não. "Keep calm, carry on" ou, como diria Manuel António Pina, "Não é o fim nem o princípio do Mundo. Calma, é apenas um pouco tarde". Bom Ano!