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O primeiro-ministro foi ao Parlamento mostrar os seus rendimentos dos últimos 14 anos. Deu ainda algumas explicações adicionais sobre a sua antiga empresa, agora na posse da mulher e filhos. “Fui além do que era exigível: expus a minha vida”, sublinhou perante o plenário da Assembleia da República, mas dirigindo-se sobretudo aos 49 deputados do Chega, que não escondiam a sua avidez por informação comprometedora que fundamentasse a moção de censura e abafasse os escândalos sucessivos dentro do seu próprio grupo parlamentar.
O mais interessante de analisar não é o álibi do Chega para o carnaval parlamentar a que todos assistimos. Houve duas questões relevantes de fundo que flutuaram subliminarmente no meio da retórica pouco elevada.
Primeira questão: queremos políticos sem passado, sem tarimba profissional em qualquer área de atividade? O Parlamento debate, escrutina e legisla sobre quase tudo.
Segunda questão: queremos ou precisamos de um striptease ilimitado e a despropósito de cada eleito para acreditarmos que não estamos entregues a pessoas menos sérias?
Chegados aqui, é importante dizer que não há respostas absolutamente corretas ou erradas às duas questões. Há, isso sim, opções a tomar enquanto sociedade. Quanto ao striptease dos políticos, podemos optar por democratizar esse procedimento e instituir o Dia Nacional da Inveja, como lhe chamou o “The New York Times”. Trata-se do dia em que os finlandeses podem consultar as declarações fiscais de todos. Desde o primeiro-ministro ao vizinho no prédio. Quanto ao quadro geral que tal opção implica, aprecio a visão de Byung-Chul Han. “Os homens têm de acreditar e de confiar no seu governante; juntamente com a sua confiança, concedem-lhe uma certa liberdade de ação e renunciam a um exame e vigilância constantes”, refere o filósofo sul-coreano.