O Mundo, por estes dias, está reduzido ao tamanho de uma "jabulani". É o supremo triunfo da popularidade universal do futebol sobre todos os problemas destes conturbados tempos. (Para quem ainda não esteja atento ao novo vocábulo, "jabulani" é a designação da indomável bola deste Mundial da África do Sul).
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Não era preciso este Mundial para atestarmos a força deste fenómeno global. Contudo, neste estado de crise profunda em que uma Europa, e não só, está dizimada, o futebol vem demonstrar como está acima da própria crise, ainda mesmo que a grande maioria das agremiações que o sustentam estejam também numa crise financeira, com dívidas não menos "soberanas".
O futebol é um jogo apaixonante. Restaura o sentido agonístico das gentes por lutas subliminares sem armas bélicas, mas desenhadas por "heróis", bem adestrados em força física e mental, numa dimensão estética de fazer inveja, congeminada por tácticas e estratégias com o "quê" de algum cientismo. O futebol atrai multidões aos estádios, às ruas, aos ecrãs gigantes. O futebol está "casado" com a televisão. Reúne todas as características para constituir-se no superespectáculo visual. O futebol é uma máquina de fazer dinheiro. Conquista todas as audiências. É o maior "vendedor" de marcas e produtos.
Eu nem o condeno. Eu adoro o futebol. Nestes desequilíbrios emocionais que "o mundo das coisas sérias" nos faz viver em lancinante angústia, é esse jogo, antevisto, visto e revisto, que nos eleva desta baixa auto-estima, individual e colectivamente nacional.
Desta feita, até tem o condão de nos fazer olhar para a África Negra, donde poderão vir promessas de um outro mundo, se não continuarem a prevalecer as opressões de ditadores, as lutas fratricidas, os abstrusos racismos.
Mas se tudo isto explica a suprema obsessão em que o mundo global caiu, por estes dias, acordando, passando o dia e adormecendo, a "viver" este Mundial, tudo isto não justifica a total obstinação pela celebração de um evento hedonístico que não nos fará sair da situação real do Mundo que nos cerca, fixado nas regras de um capitalismo que não aprendeu o suficiente para nos tornar todos felizes.
Esta obsessão desregrada em que os média nos mergulham com o Mundial a todas as horas, com noticiários destorcidos do valor dos acontecimentos, pode ter o efeito de oportuno soporífero. Mas nunca será o álibi necessário para sairmos desta crise que nos sufoca.