Com regularidade, vamos tendo notícia da posição relativa de Portugal nos mais variados temas. Entre todas essas seriações, a que compara o nosso produto per capita com os restantes países da União Europeia será a que recebe mais cobertura e causa mais mal-estar. Cada ano, mais um ou dois países nos ultrapassam. Se a tendência se mantiver, não tardará que não tenhamos ninguém atrás de nós.
Corpo do artigo
A rotina é mais ou menos a mesma: de cada vez há algum alarido e outras tantas declarações a desvalorizar a notícia ou a sublinhá-la, consoante se está no governo ou na oposição. Isolada ou conjuntamente, o executivo, a legislação laboral, a justiça, os empresários, as baixas qualificações e o sistema educativo são apontados como estando por detrás da derrapagem. Passado pouco tempo tudo volta ao mesmo, até à próxima edição do ranking, talvez por estarmos todos convencidos de que se trata de uma perda de posição relativa que não terá correspondência em termos de valores absolutos. Isto é, os outros tornam-se mais ricos mas nós continuamos e continuaremos, mais devagar é certo, a ver o nosso nível de vida melhorar. Nós podemos bem, não apenas com o mal dos outros mas também com o seu bem. Estamos alinhados com as recomendações da psicologia positiva que aconselha a olharmos para o lado bom da vida, a não sermos invejosos.
A história dos últimos 50-60 anos parece dar razão a esta perspectiva. Pontualmente, por força de crises externas ou de circunstâncias políticas específicas, há um ano, ou dois, de destruição de valor e riqueza, mais do que compensados nos anos subsequentes. A história é, porém, outra se olharmos para a década que agora acaba. Praticamente estagnado, em termos económicos, Portugal foi-se aguentando à custa de empréstimos. Vivemos acima das nossas posses, acumulámos vícios. A nossa situação financeira agravou-se dramaticamente, em consequência do acumular da dívida (pública e privada), colocando-nos na dependência dos credores internacionais. Ora estes voltam a dar sinais de que não acreditam que sejamos capazes de corrigir esta situação.
O que é que isto tem a ver com os rankings? Tudo! Se aquela desconfiança se materializar em algo mais drástico do que a subida dos juros cobrados para nos continuarem a emprestar, ou seja, se "fecharem a torneira" e nos obrigarem a pagar o que devemos, ficaremos mais pobres de verdade e não apenas por comparação com terceiros. Com a desvantagem acrescida de serem os outros que nos ditarão, sem contemplações, o que fazer.
Em casos anteriores, esse remédio resultou. Recompusemo-nos e melhorámos. Mas apenas até nos esquecermos de quanto a cura havia doído. Depois, voltámos ao mesmo modo de vida. Ou de morte.
Nas outras vezes foi uma tragédia. Agora, só pode ser comédia. "Pobrete mas alegrete" o título. Música de fundo: o tango. O enredo baseado no que aconteceu à Argentina que, há 100 anos, era o 8º país mais rico do mundo. Moral: os países não desaparecem, mas podem empobrecer. O que aconteceu ao país do tango será o nosso fado?