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Por mais que nos agitem a bandeira do patriotismo e do interesse estratégico, o Estado só entrará verdadeiramente na aventura da nacionalização da TAP se não tiver outro remédio. Porque aos números da empresa, que já eram historicamente negros antes da pandemia, se somaram 395 milhões de euros de prejuízo no primeiro trimestre do ano (apesar de um janeiro e fevereiro razoáveis) e porque se espera que no segundo trimestre o descalabro seja ainda maior. De resto, o mais provável é que a transportadora aérea acabe 2020 com prejuízos que se aproximem ou suplantem os 1200 milhões de euros estimados para um salvamento musculado. Em suma: seja qual for a arquitetura do negócio, o Estado prepara-se para engolir um sapo em forma de avião a jato por ter sobre a cabeça uma espada afiada manejada por uma mão escorregadia. E porque nenhum privado está disposto a correr o risco num contexto económico de tão grande incerteza. À TAP, como a outras companhias aéreas obrigadas a ficar em terra durante meses, só resta o amparo público para sobreviver e evitar que a sua falência arraste largos milhares de almas para o abismo.
Aqui chegados, importa, porém, acautelar que o dinheiro dos nossos impostos não vai sumir-se à velocidade a que vimos acontecer nas longas-metragens do BPN e do Novo Banco. Se o Estado passar um cheque, tenha ele quantos zeros tiver, tem de explicar em detalhe o que pretende de uma TAP pós-pandemia. Se uma empresa enxuta, mais focada no mercado doméstico (numa lógica de verdadeira coesão territorial, e não vergada a Lisboa, como tem acontecido), que olhe para os destinos da língua portuguesa com sentido de missão. Mas um plano de recuperação convincente não significa uma empreitada bem-sucedida. Ninguém consegue prever como estará o negócio da aviação e do turismo daqui a dois ou três anos. Portanto, o risco de o Estado entrar em força na companhia tem essa dimensão de imprevisibilidade e de potencial acréscimo nos encargos. Desenganem-se os que acreditam que o capital a injetar terá o efeito salvífico de uma varinha mágica. Servirá, em grande medida, para pagar salários e faturas no imediato. Os dias seguintes a uma TAP com o Estado nos comandos serão sempre de mão estendida. Sabemos como começa, não sabemos como acaba.
*Diretor-adjunto