Televisão, redes e inteligência artificial: quem quer influenciar eleições?
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Tecnologia, redes sociais e eleições. Quando os três ingredientes se misturam sem seguir uma receita bem calculada, a Democracia treme e, num ano de tantas decisões, como as legislativas portuguesas e as eleições nos EUA ameaçadas pelo regresso de Trump, só podemos ficar apreensivos com o futuro.
Ainda no dealbar dos operadores privados de televisão, Rangel lembrava que uma televisão com mais de 50% de share vendia de tudo: sabonetes e presidentes da República. Mais tarde, as redes sociais tomaram a dianteira neste campo e, entre 2016 e 2017, o Facebook foi creditado com a vitória eleitoral do Brexit, no Reino Unido, e de Trump, pelas mãos do mago Brad Parscale, que aprendeu os truques da rede social para entregar a cada utilizador um anúncio político feito à medida. Já para não referir o efeito “bolha” do algoritmo preparado para nos alimentar com notícias confortáveis e que confirmavam aquilo em que queríamos acreditar, mesmo que fosse falso. Hoje, muita desta influência chega-nos pelo Instagram e o TikTok, que, até melhor explicação, estão a ajudar a impulsionar um partido entre as camadas mais jovens.
Muito foi discutido desde então, mas as ameaças não só não cessaram como há novas à espreita, com o aperfeiçoamento da inteligência artificial e a disseminação de ferramentas que permitem adulteração fácil de imagens ou até a criação totalmente artificial de fotografias e vídeos, dificilmente distinguíveis de algo verdadeiro. O mesmo partido que apanha os jovens nas redes com vídeos divertidos, simplistas e com alguma desinformação, participa também na divulgação de algumas imagens adulteradas e partilhadas como brincadeira na Internet.
As grandes empresas de tecnologia, como a Meta, o Google e o TikTok dizem estar atentas ao fenómenos da desinformação e assinaram um acordo para combater o “uso decetivo de inteligência artificial nas eleições de 2024”, mas falta saber se há realmente capacidade em tempo real de controlar o uso dado às ferramentas lançadas no mercado a ritmo acelerado. E é nestas empresas mais poderosas do que muitos Estados que queremos confiar para salvaguardar a nossa liberdade?
Na Europa está em preparação o “Artificial Intelligence Act”, para regular o uso da tecnologia e que categoriza em quatro níveis de risco as ferramentas de IA, consoante o uso e capacidade, mas o texto ainda em desenvolvimento só deverá ter força de lei em 2026. O processo burocrático é lento e não vai chegar a bom porto a tempo de nos ajudar, enquanto sociedade democrática e que assim se quer manter, neste ano em que tudo está em jogo e em que uma decisão errada pode demorar gerações a recompor.