Ultimamente e a propósito de uma reforma que era para o ser e não o foi - a nova lei eleitoral para as autarquias locais - muito se tem falado também em alterações de fundo para as áreas metropolitanas. Não sei se no quadro de intranquilidade em que vive o Governo há condições para um debate sério sobre a organização autárquica. Tudo leva a crer que não, a julgar pelo que aconteceu com a lei eleitoral.
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O risco que se corre é o de se avançar para alterações só para tal poder ser contabilizado como atividade governativa, sem se reunirem os consensos indispensáveis à sua eficácia e estabilidade. Basta olhar para trás e rever o que se passou com a regionalização, para se perceber como é fundamental encontrar esses consensos, sobretudo entre os dois maiores partidos.
A questão que se coloca é a de saber se há, agora, condições para levar por diante uma transformação profunda na estrutura das áreas metropolitanas, envolvendo o processo eletivo, as competências, os meios e o seu funcionamento.
Eu entendo que não há.
Não faz sentido pensar as áreas metropolitanas fora do quadro das regiões administrativas. Ora todos nós sabemos, infelizmente, que tão cedo não teremos regiões no continente, tal como definidas na Constituição da República. Desde logo porque o consenso exigível nem sequer existe no seio do Governo; depois, porque não é imaginável realizar um referendo, imposto constitucionalmente, no ambiente de dificuldades e crispação que vivemos. Os defensores da regionalização sabem que é assim. Uma coisa é manter a chama viva; outra é defender a sua implementação agora. Sem condições para se avançar com a regionalização, poderá pensar-se ser de aproveitar este tempo para dar passos em frente na reestruturação das áreas metropolitanas.
A questão é que as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto são vitais para a força e a dinâmica das regiões em que se inserem. Proceder a uma reorganização que envolva a eleição direta, reforço sensível das suas competências e correspondente reforço de meios financeiros seria, no fundo, criar as regiões metropolitanas de Lisboa e Porto.
No Algarve, a situação é menos grave, por territorialmente haver coincidência entre a região e a área metropolitana. Mas para a Região Norte e para a de Lisboa e Vale do Tejo seria fatal. Depois de um entendimento generalizado de que as regiões a criar serão as cinco, sensivelmente coincidentes com as áreas das comissões de coordenação regional, poder imaginar-se que poderão vir a ser sete seria mais um tiro no pé.
Por outro lado, suponho que ninguém está a imaginar que se pudesse avançar agora com uma profunda reformulação das áreas metropolitanas, para depois passar para cima as suas competências e meios quando forem criadas as regiões. Seria irresponsável ou então uma forma assumida de debilitar a regionalização.
Um presidente da área metropolitana eleito diretamente, ou eleito em resultado da eleição direta da assembleia metropolitana, como conviveria com um presidente de região eleito com igual legitimidade? E como seria possível separar com clareza competências por forma a não haver zonas de conflito?
O produto interno bruto das áreas de Lisboa e Porto é incomparavelmente superior ao do resto da região em que se enquadram. São, por comparação com o território complementar, maiores centros produtores de riqueza e de emprego. Aqui estão reunidos os centros de decisão, as principais instituições da região, as maiores universidades, os grandes hospitais. Mesmo que a região abrangesse territorialmente as áreas metropolitanas, a força política de um presidente da área metropolitana concebida nestes moldes seria necessariamente maior que a do presidente dessa região.
Quer isto dizer que, no quadro atual, não fazem sentido as áreas metropolitanas? De forma nenhuma. Está por de mais provado que são necessárias. Com maior ou menor acerto nas suas competências de hoje, sim. Mas sem se transformarem, encapotadamente, num instrumento de fragilização das regiões.
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