<p>Bem sei que há quem as ache "românticas", espartanas e impolutas. Mas num estado onde partidos, jornalistas, facções da "sociedade civil", sindicalistas e ONG se defrontam, debatem e dividem, todos os dias, em liberdade, as FARC não têm razão legítima de existência. Nesse sentido, Sarkozy tinha razão, quando chamava a luta das guerrilhas colombianas "medieval" e sem nexo. </p>
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O mesmo disse, há pouco tempo, o insuspeito Hugo Chavéz.
A progressiva falta de apoio internacional das FARC, as suas dissensões internas (habilmente exploradas pelo CIME, o serviço de informações militares de Bogotá, que sucedeu à polémica VBI, ou 20ª Brigada), as deserções em massa, as tentativas intestinas de assassínio, a perda da guerra da propaganda, falaram mais alto.
Falaram mais alto do que a força principal das FARC: o facto de disporem de amplo território de selva, muito dele inóspito, onde podiam controlar "zonas libertadas". Falaram mais alto do que a habilidade guerrilheira, nesse território imenso, para manter um verdadeiro exército uniformizado, bem armado, mancomunado com os produtores e distribuidores de droga, quando não comanditário desse crime.
Ouvindo-se Norberto Univega, um dos raptores de Ingrid Betancourt, percebe-se como estão desmoralizadas, divididas e infiltradas as forças do "narco-terrorismo" (como lhe chamam as autoridades colombianas).
Toda a operação "Jacque", conduzida pelo CIME, é um texto clássico de introdução/aliciamento de agentes, de obtenção de informação encoberta, de entrega de sinalizadores clandestinos de posição, de intercepção de comunicações e, finalmente, de montagem de um engodo, com a oferta de deslocação dos reféns em helicópteros Mil (de fabrico russo), pertencentes a uma inexistente organização humanitária "internacionalista".
Tudo começou com a chegada à chefia das forças legais da Colômbia do general Freddy Padilla de León, em 2006. Este pára-quedista hábil, especialista em informações estratégicas e ex-comandante do VBI, decidiu mudar o rumo da guerra contra as FARC. Passou à ofensiva, com todos os meios possíveis. Conseguiu decapitar a liderança mais renitente dos guerrilheiros, conduziu operações controversas na fronteira com o Equador, e usou uma estratégia activa de contra-propaganda, acções psicológicas, uso de forças especiais e encorajamento à deserção maciça do inimigo.
A localização exacta do grupo de reféns onde estava Betencourt, no sul colombiano, perto do rio Inirida, primeiro, a 72 quilómetros de Guaviare e a 50 de Tomachipan, depois, foi possível por um complexo leque de acções internas e de ajudas externas. Da Espanha à França, dos EUA ao Equador, e sobretudo à Venezuela, executou-se uma aventura sem sangue, cujos pormenores mais sensíveis ninguém quererá, para já, revelar.
A verdade, porém, é que se tratou de uma acção político-militar sem mácula. Em duas capitais (uma europeia, outra latino-americana), os responsáveis podem dormir, com a consciência de um arriscado dever cumprido.
De Israel, os ecos são outros. Depois da tragédia do bulldozer (tensão no meio da distensão), a família do assassino considerou-o um "mártir do Islão".
Mas que mártir executa a matança de civis?
Cumpre aos responsáveis da Palestina explicar que este "martírio" não conduz ao paraíso.
Por fim, Sócrates.
Há quem diga que a entrevista à RTP foi um estertor.
Não me parece, mas nota-se que muito do que estava cimentado é hoje colado com cuspo.
E continua a não haver autocrítica.
Nem uma gota.