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Desde o seu primeiro mandato, ficou claro que Trump pensa a política como uma temporada de “The apprentice”, o reality show que o catapultou para a fama. Líderes estrangeiros são tratados como candidatos a um cargo que ele julga já pertencer-lhe por direito natural. A diplomacia é um argumento. Os aliados, figurantes. Os inimigos, antagonistas necessários para manter a tensão dramática. Os acordos multilaterais são rasgados como contratos num envelope dourado, enquanto o planeta aguarda, paralisado, a próxima eliminação.
Mas a questão mais grave não é o estilo. É o sistema que permite que o estilo vire substância. As democracias, com os seus rituais lentos e pactos acumulados, parecem despreparadas para enfrentar um Mundo onde a política se tornou um produto audiovisual. As redes sociais amplificam esse fenómeno: cada gesto de Trump – da careta à ameaça – ganha mais alcance do que uma resolução da ONU.
Num planeta repleto de zonas de tensão – Irão, Ucrânia, Taiwan, Venezuela, Palestina, Israel – a imprevisibilidade é uma moeda perigosa. No lugar da prudência, o improviso. No lugar do Conselho de Ministros, a câmara de filmar. E no lugar do cidadão, o espectador. O risco é que os espectadores, cansados ou fascinados, esqueçam que há vida fora do ecrã.
Trump não é apenas um personagem. É um sintoma. Representa o triunfo de uma era em que o ruído vale mais do que a razão. Onde se prefere a viralização à verdade. E onde a política virou spin-off do entretenimento, com menos regras e mais riscos.
Se há algo que a História nos ensina, é que os impérios caem não só pelas suas guerras, mas também pelos seus espetáculos. E quando a promessa de paz se torna anúncio de uma nova escalada, não há trégua possível – só intervalo. Até ao próximo ato.