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Recomendo-lhe que arrisque ver "The Deuce", que em Portugal está a passar no TVSéries. E falo em risco porque, quem vê, está sujeito a ver o que não está habituado a ver numa série de televisão. Nudez - feminina e masculina - explícita e frontal, sexo (não explícito) e violência crua. Física e verbal. É uma série dramática, apesar de tudo, e nada ali é gratuito, nem mesmo o binómio sexo/violência que tem sido o ingrediente principal de muitas das séries mais importantes da HBO, o canal de TV norte-americano que nos deu "Os Sopranos" ou a "Guerra dos Tronos".
Em "The Deuce", o sexo e a violência são fundamentais para caracterizar Nova Iorque nos anos 70: decadente e à beira da falência, rasgada pela droga, prostituição e crime. Apresenta-nos a um mundo brutal, feio, sujo e extremamente agressivo com as mulheres. As exploradas por donos, reduzidas a carne exposta à crueldade do desejo escondido de homens tristemente exemplares; e as que ficam esquecidas, fora do ecrã, em casa deles. E, como é obra de David Simon, "The Deuce" trata das suas personagens calma e meticulosamente, com cuidado neorrealista e frieza de caçador da selva que se vai desconstruindo, ao longo dos episódios. É, antes de tudo, um ensaio sobre a procura da normalidade no imoral, ou sobre a legítima esperança de pessoas banais presas ao grotesco que nenhuma sociedade consegue dispensar, por mais que o tente esconder. Ou esmagar.
* JORNALISTA