Timor-Leste!
Uma onda de vandalismo seguiu-se ao anúncio da decisão do CNRT, partido de Xanana Gusmão vencedor das eleições legislativas, de propor uma coligação de governo ao Partido Democrático e à Frenti-Mudança. Um jovem perdeu a vida nos tumultos que ocorreram em Díli, nessa noite de sábado, 14 de julho. Uma perda trágica e irremediável, perante a qual respeitosamente nos curvamos, e que reclama uma reflexão séria que possa contribuir para evitar sofrimentos desnecessários. A direção da Fretilin condenou prontamente as manifestações, reafirmando a sua disposição de aceitar os resultados eleitorais.
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O CNRT é a força liderante do IV Governo Constitucional que vai cessar funções nos próximos dias e iniciou diligências para formar novo governo no quadro do Parlamento agora eleito. Para debater os resultados eleitorais e deliberar sobre a política de alianças, o CNRT promoveu, no sábado, uma reunião alargada cujos trabalhos decorreram de portas abertas e onde os delegados exprimiram livremente os seus diversos pontos de vista numa demonstração exemplar de transparência democrática.
A opção tomada foi lógica e previsível. Os dois partidos escolhidos pelo CNRT para formar o novo governo fazem parte da aliança que governou até agora, aprovaram, no anterior Parlamento, o Plano Estratégico de Desenvolvimento Nacional para os próximos 30 anos, e os seus dirigentes partilharam as pastas ministeriais, incluindo o lugar de vice-primeiro-ministro. No seu conjunto, os três partidos dispõem de 40 deputados, o que constitui uma confortável maioria absoluta no confronto dos 25 deputados eleitos pela Fretilin, principal partido da oposição na anterior legislatura. Enquanto a Fretilin conquistou mais quatro lugares, o CNRT quase duplicou o resultado obtido em 2007, fazendo eleger 30 deputados, o que lhe permitiu o feito histórico de, pela primeira vez, ultrapassar a Fretilin em percentagem dos votos recebidos e dos mandatos conquistados. Cinco partidos perderam a representação no Parlamento por não terem atingido a percentagem mínima exigida de 3% dos votos. E entrou um partido recém-criado, a Frenti-Mudança, liderado pelo ainda vice-primeiro-ministro.
A continuidade da política de alianças, tão favoravelmente sufragada nas urnas, era por conseguinte a opção mais provável e a mais lógica, uma vez que o CNRT não conseguiu sozinho a maioria absoluta por que se batera.
Como se explica então a surpresa e a violência destas reações espontâneas? Em primeiro lugar, constata-se que, além de Díli, os atos de vandalismo ocorreram em Baucau e Viqueque, dois distritos onde a Fretilin obteve expressivas vitórias, o que torna mais difícil a aceitação da derrota. Por outro lado, algumas vozes influentes defenderam um entendimento com a Fretilin e manifestaram preferência por um governo de "salvação nacional", alimentando expectativas que todos reconheciam de muito difícil concretização. Tão difícil que nunca foi possível, mesmo em circunstâncias mais propícias.
Em 2002, com a transformação da Assembleia Constituinte em Parlamento Nacional, a Fretilin governou sozinha com a maioria absoluta que obtivera nas eleições constituintes e por isso arcou, solitária, com os custos da herança da administração das Nações Unidas e as dificuldades inerentes à transição para a independência, perdendo a maioria absoluta em 2007. E apesar de continuar a ser o partido mais votado, não conseguiu obter uma maioria para governar. Formou-se então uma aliança parlamentar de cinco partidos, liderada por Xanana Gusmão, que apoiou um governo que durou toda a legislatura e ainda se mantém em funções. Não se justificaria, por maioria de razão, um governo de "unidade nacional" em 2002, ano primeiro da independência, ou em 2007, quando havia mais de 100 mil deslocados e bandidos à solta pelas montanhas? Uma Fretilin reforçada no seu papel de grande partido da oposição não será melhor garantia de pluralismo político e de exercício transparente das funções de fiscalização do Parlamento?
Questões, enfim, a que os timorenses saberão responder.