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O título poderia ser uma metáfora sobre o resultado do jogo de Portugal mas após a bola rolar outras coisas permanecem. Uma delas está a destruir a reputação do país. Qual? Nada de novo: as sistemáticas greves das empresas de transporte. Nenhum outro sector bate os recordistas da destruição da CP - os maquinistas. Mas se as greves nos comboios acabam por ter impactos essencialmente internos já os navegadores aéreos e os pilotos estão num campeonato global. Os seus efeitos arrasam a imagem de Portugal além de, em concreto, partirem em pedaços um dos mais cruciais pilares da recuperação nacional - o turismo. Estes trabalhadores têm direitos a defender? Sim. Mas quando se espreme a natureza das reivindicações fica-se com a sensação de desequilíbrio entre o poder da greve e as suas repercussões nas vítimas. As limitações ao direito à greve são difíceis de questionar mas na 'natureza económica' nada se perde, tudo se transforma. Neste caso, isso significa que empresas de aviação estrangeiras e outros mercados turísticos vão ficando com os nossos clientes.
A prazo isto vai virar-se profundamente contra os trabalhadores. Mais tarde ou mais cedo a CP será privatizada e os maquinistas lentamente despedidos. A TAP passará para mãos estrangeiras e veremos quem aguenta este tipo de abordagem dos pilotos. A navegação aérea começa a ser demasiado importante para estar nas mãos dos 'civis'. E assim se constroem estados musculados, com apoio das pessoas... Assim se perdem direitos inalienáveis, assim se corrói a democracia. Porquê? Pela absoluta falta de bom senso dos protagonistas de hoje, vítimas de amanhã - vítimas das suas próprias intransigências.
Centenas de milhares de pessoas serão afetadas entre hoje e a próxima terça-feira pelas tais greves no controlo aéreo e depois seguem-se os pilotos da TAP na quinta e sexta-feira da próxima semana. Para já. Haverá mais. Os agentes de viagens deitam as mãos à cabeça. A gestão da TAP sabe que as reservas são anuladas ou nem chegam a ser feitas por se espalhar a notícia de hipotéticas greves. Dou o meu exemplo: tento nunca marcar viagens na Air France. Não há país mais imprevisível para greves que a França. Imagino que muitos estrangeiros comecem a fazer o mesmo com a TAP.
Vendo as coisas em concreto: a empresa de navegação aérea (NAV) deve ou não ser tratada como empresa pública? Admito que os trabalhadores queiram o estatuto europeu por pertencerem a um organismo quase 'supranacional' quanto às regras e métodos de trabalho. Mas, ainda assim: que chão pisam? Quem paga o salário? Que regras existem para os sectores públicos como o seu? Todas as respostas levam à mesma conclusão: os sacrifícios na NAV têm de ser idênticos aos dos outros.
Na TAP a situação económica torna esta radicalização ainda mais crítica e isto gera um consenso no país para uma medida tendencialmente errada: perdermos a TAP como âncora do turismo e da mobilidade. Gosto das low-cost mas não me iludo: quando não houver concorrência, elas deixam de ser low-cost. No entanto, à força de tantas greves e tantos prejuízos é quase épico defender-se a manutenção da companhia em mãos públicas. Os sindicalistas 'extremos' que temos estão a tornar liberais até os mais esquerdistas... Portanto, ficamos assim: ou a Lufthansa compra a TAP ou ela vai parar às mãos não se sabe muito bem de quem. Os alemães já são o nosso mal menor (uma vez mais).
Neste caos aéreo só falta mesmo o Governo entregar a ANA como uma empresa única a alguém que relativize o interesse do Porto em ter mais companhias aéreas. Uma segunda cidade precisa de uma lógica própria para crescer. Todos beneficiam. Isso significa provavelmente entregar o aeroporto a um operador diferente do da capital, capaz de oferecer taxas aeroportuárias mais competitivas. Se impedirmos o desenvolvimento do transporte aéreo do Porto bloqueamos o principal propulsor da internacionalização portuguesa: as pessoas que têm viajado para o Mundo a partir do aeroporto Francisco Sá Carneiro. O custo deste retrocesso será insuportável. Significa tapar ainda mais a única saída que temos para o país.