Muito se escreveu no âmbito da Semana Europeia da Mobilidade, sobre os enormes desafios das cidades: as alterações climáticas, a transição energética, o tráfego, a falta de qualidade urbana nas cidades, a saúde pública, a necessidade de uma nova cultura de mobilidade.
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Contudo, o uso de automóvel continua a disparar em Portugal, colocando-nos a questão de qual o papel efetivo deste movimento.
Abel Coentrão escreveu que o “dia europeu sem carros deveria ser substituído pelo dia europeu das ruas com gente”, onde se conseguisse vislumbrar o canto dos pássaros pelo silenciar dos motores, a alegria das crianças e dos idosos a utilizarem as praças e os jardins da cidade. Precisamos de mais espaço público para a vida na cidade.
Mas a tendência parece regressiva. Na mesma semana da mobilidade anunciou-se que a via rápida de Almada à Costa da Caparica vai aumentar para quatro vias de trânsito em cada sentido, em vez de se criar um sistema eficiente de transporte público. Alguns BRT em construção vão retirar espaço às ciclovias e passeios, mantendo os canais rodoviários.
Continuamos a estacionar em cima dos passeios, em segunda fila e em ruas pedonais. Mesmo com os combustíveis a preços incomportáveis, a taxa de motorização continua a aumentar. E nem o recém teletrabalho tem diminuído as deslocações de automóvel.
Ou seja, se por um lado temos uma retórica coletiva musculada nas prioridades e até com fundos estruturais, por outro a situação está pior.
Reconheço o esforço de muitos autarcas, mas sempre com uma enorme oposição no terreno, face a um espectro cultural extremamente resistente.
É tempo de agir! Temos uma bomba-relógio nas nossas mãos.
* Especialista de Mobilidade Urbana