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Há cerca de 15 deputados do PS que se candidatam a autarquias. Fica-se com a suspeita que, se fosse hoje, o PS teria dificuldades em arranjar candidatos para algumas delas
1 Parece o Toque de Midas, mas de pernas para o ar. Tudo o que o PS toca se transforma numa coisa má. Que melhor exemplo que a recente decisão de impedir as candidaturas duplas às eleições legislativas e autárquicas? Uma decisão sensata, que permitiria aumentar a transparência e ajudaria a combater a ideia de que os políticos estão apenas interessados em garantir um tacho. Só que entretanto houve eleições europeias e com elas a derrota. E o que antes seria interpretado como uma decisão sensata, é agora visto como uma decisão hipócrita. Uma tentativa desesperada de ficar um pouco melhor na fotografia, de reconquistar algum respeito entre os eleitores.
Os adversários, por exemplo o PSD, rejubilam com este novo material e já sugerem que Ana Gomes (Sintra) e Elisa Ferreira (Porto) sejam obrigadas a fazer a escolha: ou ficam no Parlamento Europeu e deixam o PS sem candidatos àquelas autarquias, ou mantêm-se na corrida autárquica e abandonam o cargo e as mordomias de eurodeputado. Do mal o menos, porque da oposição se espera que tire partido das fragilidades do PS. O problema é que também do interior do partido chegam várias e sonoras críticas a decisão tão precipitada.
Há pelo menos 15 deputados do PS que se candidatam à presidência de outras tantas autarquias. E alguns deles não estão nada satisfeitos com este empurrão para a exclusividade ou, para usar expressão já ouvida, com mudanças de regras quando o jogo já está lançado. E percebe-se porquê. A vitória em boa parte dessas autarquias é improvável, sendo que agora não há o tacho da Assembleia da República. Fica-se com a fundada suspeita de que, se fosse hoje, o PS teria alguma dificuldade em arranjar candidatos para algumas câmaras.
2 Em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão. Ou seja, para que possamos dizer que vivemos numa democracia, é preciso que todos os cidadãos tenham um rendimento digno, que garanta algum bem-estar, acesso à saúde, à educação. Não é uma conclusão individual a partir de um adágio popular. É mesmo isso que valorizam os portugueses, de acordo com um estudo promovido pela SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) sobre "A qualidade da democracia em Portugal: a perspectiva dos cidadãos".
Quando se pediu que elencassem as características essenciais de uma democracia, foi então para "um rendimento digno para todos" que apontaram 49% dos inquiridos. Segundo os autores do estudo, uma resposta que não é condicionada pelo facto de se ser de esquerda ou de direita, do partido A ou do partido B. A "realização de eleições", só para avançar um termo de comparação, só foi referida por 27% dos inquiridos. Conclui-se que os portugueses querem mais pão e menos circo, sendo que atravessamos um período em que há pouco do primeiro e demasiado do segundo.
Nesta radiografia à pobre democracia portuguesa, a classe política é colocada num patamar rasteiro. São 75% os que pensam que quem está no poder busca sempre os seus interesses pessoais. A mesma quantidade acha que os políticos não se preocupam com o que pensam os cidadãos. E outros tantos que o cidadão não tem qualquer influência sobre o que o Governo faz. Foi nisto que deu a permanente sensação de que os políticos só pensam no tacho.