Podia muito bem tratar-se de mais um daqueles tão propalados casos de promiscuidade entre política e futebol. Mas não é. Trata-se apenas de uma coincidência. Ou melhor: duas coincidências. Daquelas em que os protagonistas negam a realidade e vão em frente como se o mundo à sua volta permanecesse imutável.
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O selecionador nacional que conduziu um Portugal lesionado a uma vergonha mundial venceu apenas o último jogo da nossa triste prestação brasileira. Ganhou uma partida e desbaratou a esperança de todo um país que viu incrédulo Cristiano Ronaldo a marcar mais idas ao cabeleireiro do que golos na baliza do adversário. E, mesmo assim, Paulo Bento não admite sequer sair. Resguarda-se num contrato para ficar de novo a tentar a sua sorte no Europeu daqui a dois anos. A sorte dele e a de Portugal. Pode ser que por essa altura o melhor jogador do Mundo já não o seja e, se ainda o for, talvez já não tenha o alto patrocínio de uma conceituada marca de champô para combater a caspa que o obrigue a cuidar mais do cabelo do que dos resultados. Se tiver passado a avalancha de lesões pode até ser que Paulo Bento não tenha que marcar estágios numa farmácia de stock farto. É aqui - na farmácia - que se cruza mais uma coincidência entre a nossa peculiar política e o nosso desastroso futebol. No PS, onde a guerra de nervos é ainda maior do que na seleção - até porque o campeonato pela liderança do partido ainda vai a meio - a disputa pelo poder também passa pela botica que é onde Seguro anda a ver se ganha apoiantes.
O secretário-geral do PS, que é uma espécie de Paulo Bento da política, tem-se resguardado na ortodoxia dos estatutos socialistas para não sair de cena após ter ganho as últimas eleições europeias numa espécie de prolongamento e sem que, tal como Paulo Bento, tivesse convencido os portugueses ou sequer os seus camaradas de partido das vantagens de continuar a liderar a equipa. Não se estranhou por isso o aparecimento de um manifesto assinado por Mário Soares, Jorge Sampaio, Manuel Alegre ou Almeida Santos onde estes pesos-pesados socialistas expressavam um claro apoio a António Costa. Mas de Seguro nem um sinal de querer acabar com o jogo e avançar para congresso, essa espécie de final que o líder socialista insiste em não querer disputar.
A este grupo de históricos do PS juntou-se ontem mais um grupo de notáveis socialistas no apoio à candidatura do autarca de Lisboa para liderar os destinos do partido. Contra Seguro. Diz o grupo - onde se destacam, entre outros, Arons de Carvalho, Alfredo Barroso, Mário Mesquita e, outra vez, Mário Soares - que só Costa oferece ao país uma "alternativa política sólida, clara e de Esquerda" e que por isso deve ser ele o candidato às próximas legislativas.
A tudo isto Seguro diz nada. E o pouco que diz é para acenar com os estatutos e agitar a cenoura de umas primárias que acabaram por encurralar António Costa e os seus apoiantes. A continuar assim, Seguro não vai morrer politicamente de velho. É tão certo quanto Paulo Bento cair de maduro antes do próximo europeu de futebol...