Três anos, três palavras: guerra, resistência, território
Na semana em que se completam três anos de guerra na Ucrânia, tudo, que é tanto, pode ser resumido afinal a três palavras: guerra, resistência e território (este integrando as terras raras ricas em minerais valiosos).
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Guerra: Se a guerra é tão velha quanto a existência da humanidade, na Ucrânia, a guerra é tão antiga como a existência dos Estados vizinhos: Federação Russa, Bielorrússia, Polónia, Hungria, Eslováquia e Roménia. A Ucrânia é uma nação habituada a viver em conflito, porque, afinal, com curtos espaços de paz, está em guerra desde sempre. Só com a Rússia esteve em conflito uma meia dúzia de vezes, especialmente desde a anexação da Crimeia.
Se revisitarmos a história entendemos facilmente que os ucranianos estão habituados a estar em guerra e isso deveria ter sido um elemento dissuasor da invasão russa em 24 de fevereiro de 2022, mas não foi e os resultados estão à vista. Agora, três anos volvidos, a guerra continua e a determinação dos ucranianos, apesar de começarem a faltar os apoios internacionais de maior peso, parece manter-se intacta.
Porém, com a chegada de Trump à presidência dos EUA, o conflito entrou numa nova fase. Trump afirma querer acabar com a guerra rapidamente, mas com que custo? Com a perda de território para o Estado invasor; com a cedência de parte significativa das riquezas das terras raras para o invasor e os EUA; com a abdicação da entrada na NATO pela Ucrânia, a única pertença que pode dissuadir futuras invasões; com todas as despesas da recuperação da Ucrânia a serem pagas pela União Europeia... Enfim, é a guerra na sua natureza cruel e implacável, sujeita à ditadura do poder económico e das armas.
Resistência: Zelensky, o rosto da resistência, para muitos, inesperada, para outros tantos, inacreditável, elevou a palavra resistência a uma dimensão a que só são capazes de chegar os que estão destinados a agigantarem-se perante situações desafiantes para a humanidade.
Um ator, comediante, como muitos ainda dizem em tom depreciativo três anos depois da invasão russa, agigantou-se ao longo desta guerra que já matou mais de 12 mil civis na Ucrânia, mais de 100 mil soldados ucranianos e russos, milhares de feridos e de desaparecidos, e destruiu grande parte da Ucrânia.
Zelensky, goste-se ou não, afirmou-se como líder dos ucranianos. Mesmo com o desgaste de três anos de combates, destruição, mortos e feridos, suspeitas e controversas, prossegue, firme, em nome do povo ucraniano. Uma recente sondagem fidedigna atribui-lhe 57% das intenções de voto se houver eleições.
No início desta semana, surpreendeu o mundo ao afirmar que está disposto a renunciar ao cargo de presidente da Ucrânia imediatamente se a sua saída for necessária para acabar com a guerra e para viabilizar a entrada do seu país na NATO. Portanto, troca o seu cargo pela paz e pela segurança futura do seu povo.
É um resistente que se bate pela soberania da Ucrânia desde que foi eleito, sem sombra de hesitação desde que o seu país foi invadido pela Federação Russa, e que acaba de revelar que sabe sair se for preciso para salvar o seu país do jugo russo. Esta é também uma forma de responder à acusação de Trump que o apelidou de ditador, quando é sabido que a Constituição da Ucrânia estabelece que, estando o país sujeito a uma invasão estrangeira, as eleições podem ser suspensas.
É este ‘Senhor Resistência’ que deverá reunir forças, mais uma vez, para se reunir com Trump, ainda esta semana, em Washington, para negociar uma paz duradoura, não nos termos em que a queria Putin, mas em moldes viáveis para a Ucrânia.
Território: A luta da Ucrânia é pela integridade das suas fronteiras. É pela soberania da nação. É pela independência face a qualquer apetite da vizinhança. Mas, desengane-se quem ainda pensa que este é um problema exclusivo da Ucrânia. Esta é uma luta da Europa. O que se joga no teatro de operações bélicas na Ucrânia é o futuro da Europa.
Se a paz que os EUA e a Federação Russa deram, por estes dias, mostras de querer fazer, prevalecesse, teríamos uma paz podre, à espera da próxima investida do invasor. Seria a paz tão desejada, dirão alguns. Desenganem-se! Seria uma paz passageira e a troco das riquezas das terras raras e da perda de território ucraniano. Num mundo a sério, onde o direito internacional seja respeitado, essa paz não passará do plano de intenções de Trump e de Putin. Se passasse, o mundo seria outro.
Está ‘de jure’ e ‘de facto’ a nascer um novo equilíbrio geopolítico mundial e a Europa tem de decidir, de forma emergente, qual é o seu lugar no tabuleiro de xadrez mundial. A China, descontente com a política económica de Trump, já se antecipou e juntou-se ao México e ao Canadá. É imperioso que a União Europeia se una à China para contar no conserto das nações. Pode não ser o melhor dos pares, mas, por agora, é preciso dançar a sua dança. Se a União Europeia não o fizer será insignificante à mesa das futuras negociações de paz.