<p>1. Quem disse que não se pode governar em minoria? Quem disse que a estabilidade só é possível com o poder absoluto? Na verdade dissemos quase todos, mas já foi na década passada, ninguém se lembra. Meia dúzia de dias depois já estamos noutro ano e, mais importante que isso, Cavaco Silva já nos fez a sua arenga de Ano Novo. Ouvimos e obedecemos. Como que por milagre, os mesmos partidos que ainda agora se odiavam já trocam beijos na boca, ainda que por interpostas pessoas e do lado de fora do Parlamento. As divisões entre as esquerdas não eram assim tão grandes que impedissem a aprovação do casamento gay. Como as divisões entre o centro-esquerda e o centro-direita não serão assim tão grandes que impeçam a aprovação de um Orçamento de Estado com sabor a queijo. E até um conflito tão longo e azedo como o dos professores com o Governo se transformou numa história com um final digno de uma novela da TVI, com os noivos casados e felizes… pelo menos até 2011.</p>
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2. Voltemos ao casamento gay. Primeiro para dizer que se tratou de um bom momento no que respeita ao fim da descriminação dos cidadãos com opções sexuais diferentes da norma. Um salto civilizacional tão evidente que nem a Igreja se deu ao trabalho de perder demasiado tempo a contestá-lo. Com a excepção de um número limitado de "ayatollhas", os homens que verdadeiramente contam - como D. José Policarpo ou D. Manuel Clemente - limitaram-se a cumprir calendário, e apenas quando pressionados por terceiros, conscientes que a idade das trevas já lá vai. Mas também é preciso dizer que o que se emendou com uma mão, se agravou com a outra. Discriminar um casal homossexual numa situação de adopção, pior do que uma eventual inconstitucionalidade, é penalizador para crianças que precisam de uma família. São conhecidos casos de indivíduos homossexuais a quem foi permitido adoptar uma criança. Se forem aos pares e de mão dada já não servem?
3. Seis autarquias pagam, por ano, 13 milhões de euros de juros e amortizações. Não se endividaram para fazer escolas. E, ao contrário do que possa parecer, também não foi em nome do desenvolvimento desportivo. Este é o custo anual, que se multiplicará por muitos anos, da construção de cinco estádios (Braga, Aveiro, Coimbra, Leiria e Faro/Loulé) para o Euro 2004. Arenas onde cabem muitas dezenas de milhares de pessoas, mas que recebem umas poucas centenas de 15 em 15 dias. Passada a festa do Euro, lançados os foguetes, quem ficou com as canas foram as populações de seis concelhos a quem certamente fariam melhor proveito escolas renovadas, tratamento de esgotos e ruas com menos buracos. Mas não desesperemos. Se Gilberto Madaíl conseguir trazer o Mundial para Portugal, o Estádio do Algarve poderá passar de 30 mil para 50 mil lugares sempre vazios. Um cenário imponente.