Trump ganharia as autárquicas portuguesas
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A eleição de Trump surpreendeu um pouco todos - quer os que estavam por Trump quer os muitos mais à volta do Mundo que estavam contra ele.
No entanto, uma das belezas insofismáveis da democracia é a de dizer muito dos eleitos mas muito mais dos eleitores. Ao contrário das ditaduras e tiranias, que dizem muito pouco da população em geral.
Em democracias estabelecidas, as pessoas fazem do voto e do direito ao voto um complexo de realidades. Para uns, o voto é uma descarga de consciência, para outros uma oportunidade de sonhar, para terceiros uma fuga aos medos e para os restantes uma obrigação cívica ou moral. De qualquer modo, outro aforismo sobre a democracia recorda que os eleitores merecem os eleitos. Porque o eleito tem algo que a maioria dos votantes procurava - podem não ser os aspetos mais imediatos, mais propalados ou mais evidentes. Mas sem dúvida o perfil, o discurso e o ideário dos eleitos captou algo de motivador na maioria dos votantes.
Sabemos que Trump foi o candidato que ofendeu, ridicularizou e que estigmatizou adversários, apoiantes dos adversários e comunidades. Mas também foi o candidato alvejado, pop star com miríades de trump-stores e com milhões de memes nas redes sociais.
Decerto muitos dos que apoiaram Trump não se reveem nessa falta de “fair play” nos debates, mas ao votarem nele desculpabilizaram e relativizaram esse estranho “fair play”. Quem nunca viu um jogo fraco da equipa predileta e desculpabilizou a atitude menos desportiva dos atletas ou dos dirigentes? Quem nunca tomou o partido pelo parente que não foi bem-educado na rua? É correto fazê-lo? Não o será, mas é humanamente compreensível.
Atitudes parecidas com as de Trump na abordagem aos adversários políticos são muito comuns à nossa volta. Quem não conhece pelo menos um ou dois (ou até meia dúzia) de autarcas e candidatos a autarcas que não foram os mais polidos nas abordagens junto de opositores? E no entanto vários desses (para não dizer muitos, ou, até com receio, a maioria) ganhou depois do “jogo sujo” ou do “jogo menos limpo”. Argumentos como o “calor do momento”, a ansiedade acumulada, problemas pessoais ou até o passado empático ajudaram a desculpabilizar a atitude menos certa pelo eleitorado que o estima. Já o outro, quando é mal-educado, é pior do que mal-educado.
Coisas de maiorias, sejam relativas ou absolutas, assim como coisas de cair em graça ou de ser engraçado. Ou, como dizia um psicólogo, de “assimetria de perceção”. Levará esta “escola de bullying político” a termos autárquicas menos polidas no próximo ano? Em concreto, acho que levará a termos candidatos a autarcas mais honestos no discurso - seja essa honestidade polida ou não, necessitada de estômagos fortes e de digestivos capazes.