Quando começou, Donald Trump era o mais improvável dos candidatos à Casa Branca. Não vinha da política. Vinha do betão e do negócio imobiliário, da hotelaria, dos casinos, da publicidade televisiva, dos "talk shows". Vinha, até, contra a dita política sediada em Washington e em Wall Street, representada indistintamente por democratas e republicanos. Derrotou mais de uma dúzia de candidatos republicanos antes de conseguir a nomeação. E, finalmente, Hillary Clinton que, aos olhos dele, somava tudo o que afirmava combater. Vai para a segunda semana como presidente dos EUA e teve uma primeira em cheio. As "ordens executivas" que assinou, e fez questão de mostrar ao Mundo como quem exibe um menu de restaurante de luxo, perturbaram a chamada "ordem internacional" das coisas. Mas ele avisou ao que vinha e está a cumprir as promessas que fez, coisa a que a "ordem", sobretudo a europeia, não estava habituada. É muito cedo para o avaliar apesar dos esforços dos que o veneram e dos que o execram. "Trump é um pantomimeiro, um ignorante em matéria de governação, de história, de ciência, de filosofia, de arte, é incapaz de expressar ou reconhecer subtilezas ou nuances, não é decente e babuja um vocabulário de setenta e sete palavras que mais parece "idiotês" que inglês". Isto disse o escritor Philip Roth dele, por mail, a uma revista norte-americana. Um retrato demasiado familiar para quem conhece a maioria dos actuais governantes europeus. Ora como a ignorância é famosamente atrevida, o homem é sobretudo atrevido. Para já, baralhou a tradicional dicotomia Esquerda-Direita. Muito do que ele defende é, por exemplo, defendido pelo PCP e pelo Bloco. Que outra coisa, que não o "isolacionismo" patrioteiro anticosmopolita, são o "governo patriótico e de Esquerda" do primeiro e a "saída do Euro" defendida pelo segundo? Depois, faz tábua rasa da língua de pau que domina as democracias mediáticas ocidentais e especialmente a administração Obama. Está-se nas tintas para a gritaria, mais ou menos patética, que meio mundo interno e externo anda a exibir contra ele. Trump, porém, não funciona sozinho. O "sistema" norte-americano é de "pesos e contrapesos", até mesmo dentro do Governo Trump. E, ainda este fim-de-semana, alguns tribunais locais já suspenderam a "ordem" sobre imigração. Por junto, haverá no ar alguma conspiração específica contra o Mundo, movida por Trump, como sugerem alguns prosélitos? É que já havia várias antes de ele chegar.
*JURISTA
O autor escreve segundo a antiga ortografia
