"Podemos deixar de ir ao aeroporto buscar passageiros". Quem o diz é o líder da Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros (Antral), revoltado com o acordo que a TAP celebrou com a Uber, uma operadora do serviço de táxis privados que chegou também a Portugal. Enquanto passageiro e utente do aeroporto de Lisboa, a minha vontade é convocar as massas para um "podemos deixar de utilizar os táxis do aeroporto". Passo a explicar.
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A história começa com mais um estrondoso caso de sucesso de uma startup californiana, a Uber, que criou uma aplicação que liga clientes a táxis privados (viaturas privadas conduzidas por não profissionais), permitindo assim deslocações cujo preço é, em princípio, mais económico quando comparado com o serviço equivalente em táxis normais. O cliente pede o serviço através da "app", que deteta a sua posição geográfica e lhe atribui um dos seus condutores que esteja nas proximidades, sendo o custo da corrida debitado através do cartão de crédito que forneceu aquando do registo na plataforma Uber. Simples e confortável.
Esta inovação cedo começou a fazer o seu caminho nas principais cidades do Mundo. Mexeu com interesses, naturalmente, e a reação corporativa dos serviços de táxis regulares era, mais do que esperada, compreensível. Afinal de contas, este é um negócio de escala, o que faz com que haja quem valorize a Uber em 40 mil milhões de dólares!
Da contestação dos taxistas aos entraves legais, foi um passo. A Uber foi banida de algumas cidades por razões que se prendem com o licenciamento da atividade. Embora a empresa garanta a qualidade das viaturas e dos condutores, verificando nomeadamente os antecedentes destes últimos, a sua vida não tem sido fácil pois é agarrada na teia burocrática das taxas, licenças e inspeções, devidamente ativada pelos sindicatos e associações de transportadores que se sentem ameaçados.
O episódio recente do motorista Uber que violou uma passageira na Índia foi explorado ao máximo pelos opositores do serviço. A verdade é que as violações na Índia não são propriamente caso raro e, quanto aos serviços de táxi naquele país, a violação das regras é generalizada, o que inclui, por exemplo, "transacionar" o passageiro ao longo do percurso, fazendo-o mudar de viatura numa mesma corrida.
A regulamentação do setor dos transportes rodoviários é muito conservadora, não se tendo adaptado às extraordinárias mudanças dos últimos anos, decorrentes do advento da Internet e da generalização de dispositivos móveis. É assim natural que inovações como a da Uber tenham de fazer um caminho que não se afigura fácil, mas que será, a meu ver, inexorável. O que está em causa é uma forma de resolver um problema da sociedade (a mobilidade) através da utilização de recursos ociosos (as viaturas privadas e os condutores) e ubíquos (a "app" no smartphone com acesso à Internet que todos temos no bolso), a um preço vantajoso para o consumidor. É uma fórmula imbatível, por muitos regulamentos que, por ora, possam ser invocados.
Estou, assim, certo de que o paradigma das deslocações em veículo ligeiro se vai fatalmente alterar, assumindo um modelo de mobilidade a pedido ("mobility on demand", na expressão cunhada nos EUA) que será próximo daquele que agora a Uber propõe. Quem o percebeu bem foi o governo local de Washington, que em vez da interdição do serviço Uber promoveu a criação de uma outra plataforma semelhante para lhe fazer concorrência.
Em Portugal, o Uber chegou primeiro a Lisboa com um serviço de viaturas de gama alta e depois ao Porto com uma versão mais acessível. As reações fizeram-se sentir, mas o que provocou a ira da Antral foi mesmo o acordo da empresa norte-americana com a TAP, que pretende assim promover melhores condições de acesso dos seus passageiros ao aeroporto de Lisboa.
E aqui chego ao meu ponto. Para quem oferece um serviço tão desqualificado como o dos taxistas da praça aeroportuária da capital, a Antral devia moderar as suas ameaças. É que se em relação à Uber podem existir dúvidas sobe a qualidade do serviço, em relação aos táxis do aeroporto eu só tenho certezas. Sem generalizar, são pouco sérios na escolha dos percursos, são pouco educados, ignoram os passageiros na hora de ouvir o relato da bola, apresentam-se mal e não evitam aquele olhar de macho quando a cliente tem a saia mais curta. Quem nos protege destes?