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A novela terminou, finalmente. Mas foram precisos quatro meses para concluir o óbvio. Sancionar Portugal e Espanha, sob argumento de que os países não tomaram as medidas necessárias para reduzir os défices, é um disparate. A Europa assenta nos pilares da coesão e da solidariedade. Sucede que todo o processo, mesmo se justificado na interpretação de regras que existem, foi de sinal contrário e pior, teve como protagonistas no papel acusatório quem muitas vezes falhou no passado, sem retirar disso lição ou modéstia.
Um país como Portugal, capaz de reduzir um défice superior a 11% do PIB em 2010, para menos de 3% no final de 2015 - não contabilizado o esforço extraordinário do Banif - aplicando com sucesso pelo caminho um programa de ajustamento carregado de austeridade que o PS negociara no Governo com a troika e o PSD e o CDS patrioticamente subscreveram, ponderada pragmaticamente a falta de financiamento dos mercados, só poderia ser elogiado, nunca castigado.
Acresce o facto de que, numa UE entre iguais, usar como exemplo pedagógico ou sacrificados de conveniência dois países do Sul, deixando de fora outros que incumpriram as mesmas regras, é indigno, porque arbitrário.
Quando a França anunciou unilateralmente em 2014 que não cumpriria a meta do défice, não caiu o Carmo e a Trindade. E a França não foi incluída no processo levantado a Portugal e a Espanha. O facto é ainda mais absurdo, sabendo-se que o atual comissário para os Assuntos Financeiros foi ministro das Finanças do Governo de François Hollande, negando à frente dos destinos da UE a Portugal e a Espanha o que como governante exigiu para a França.
Recentemente foram publicadas confissões do presidente francês, denunciando um acordo com a Comissão Europeia, que excluiria os gauleses das regras impostas aos outros. Hollande é citado a dizer: "É o privilégio dos grandes países (...) nós dizemos: nós somos a França, nós protegemos-vos, temos umas forças armadas, uma força de dissuasão, uma diplomacia (...) eles, os europeus, sabem que precisam de nós e portanto isso paga-se".
Tive a oportunidade de dizer no Parlamento Europeu, junto dos eurodeputados dos outros países e na presença do ministro Mário Centeno, que a França é a França, mas Portugal é Portugal. Também temos forças armadas, diplomacia e um lugar no Mundo e na história que outros mais poderosos nunca alcançaram. Os portugueses não têm de pagar a diplomacia e os exércitos alheios.
Portugal não é menos do que a França.
*DEPUTADO EUROPEU