<p>Gostei de ouvir Vítor Constâncio em Bruxelas com a auto-estima intacta, em melhor estado do que as nossas depauperadas contas públicas, e lamento o adiar da decisão europeia sobre quem vai assumir a pasta da supervisão e a vice-presidência do Banco Central Europeu, uma vez que, provavelmente, a ter decorrido a votação segunda à noite, teria saído vencedor.</p>
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Percebo o entusiasmo de Elisa Ferreira e a generosidade de Paulo Rangel. Para o PS, a sua eleição é um acto de justiça, depois dos extremosos serviços que o senhor em causa lhes prestou. Para os sociais-democratas, mostrar que não há ressentimento que se sobreponha ao interesse nacional só lhes fica bem. Há também quem pense que em vésperas da tormenta, um compatriota poderá ser-nos útil, num posto que envolve os dinheirões europeus.
Sobre o assunto, manifesto aqui idêntico empenho. É claro que não sei se alguém que falhou em Portugal pode ser útil no estrangeiro, onde nos poderá causar embaraços e, quem sabe, ainda maior prejuízo. Não me revejo no nacionalismo de quem acha que alguém ou alguma coisa nos serve necessariamente melhor, só por ser de origem portuguesa. Não me creio, também, em dívida de gratidão para com a pessoa em causa. Mas entendo haver razões de sobra para apoiar a partida de Constâncio para a Europa porque penso que há muito deveria ter saído, pelo seu pé, do Banco de Portugal. Não tenho obsessões, nem discuto a sua inegável competência técnica, mas não tenho dúvidas que, com base em tudo aquilo que é do conhecimento público, fracassou no seu desempenho ao nível da regulação e da supervisão das instituições de crédito que fazem parte das suas atribuições enquanto governador, e que estarão sobre a sua alçada caso seja eleito para o almejado cargo. Isso sucedeu no BPN, em que não viu o que até a vox populi percebia, e também no caso BCP que, não fosse pelas lamentáveis zangas domésticas que tiveram lugar, ainda estaria por descobrir. As consequências para as finanças públicas e para muita gente são por demais conhecidas.
Também em matéria de opinião, previsão e aconselhamento, julgo que Constâncio não actuou com a equidade que se exige a quem ocupa o cargo. Foi severo com os governos do PSD e pareceu sempre subserviente com os do "seu" PS, como por exemplo no arredondamento do défice de 2005.
Felizmente, há quem compreenda que o desempenho do cargo não se mede por esse desvelo político. No seu blog "Causa-Nossa", Ana Gomes confessa-se inquieta com "a constância da relutância do Dr. Constâncio" e diz que nunca lhe vislumbrou "ensaio do menor, do mais ténue, tímido ou disfarçado assumir de alguma responsabilidade. Ora, algum mea culpa é devido por quem devia regular e não regulou, por quem devia supervisionar e não supervisionou, ainda por cima havendo relatórios (…) a pedir e recomendar medidas urgentes".
Concordo com a avaliação e, desejando que ocorra a desgovernamentalização e o aperfeiçoamento técnico do BdP, onde há muita gente competente, e também que Constâncio tenha, apesar de tudo, aprendido alguma coisa com os seus erros que tão caro nos saíram (e o que lhe pode ser útil na Europa), espero poder dizer-lhe adeus. Não posso é deixar de dizer, em nota final, que simpatizei com a postura de Nuno Melo que, mesmo a custo de um aperto de mão do compatriota, não esqueceu o que se passou na comissão de inquérito que o PS branqueou. Mas acredito que, tal como eu, o eurodeputado só respirará de alívio quando Constâncio se for embora…