Nos meus tempos de estudante na universidade, para renovar a matrícula, era obrigatório ir ao BCG fazer a prova tuberculínica e tomar a vacina se fosse necessário. Nunca me ocorreu que isso violasse a minha liberdade individual. Pelo contrário, sempre achei que o procedimento me protegia da tuberculose, a mim e aos outros com quem convivia diariamente.
Corpo do artigo
Embora muito pequena, também recordo o alívio com que tomei a vacina contra a poliomielite, uma doença que tinha deixado para sempre paralisado o braço de uma prima minha, o que foi um grande desgosto na família.
Tomar, como obrigatória, a vacina contra doenças contagiosas tornou-se para mim tão óbvio como não poder entrar em casa dos outros sem a sua autorização. Porém, quando vejo a contestação ao certificado de vacinação e a percentagem de pessoas não vacinadas por vontade própria, fico a pensar que há quem se ache com direito a tudo e sem uma única obrigação para com os outros.
Acontece que já temos abundantes dados que nos mostram que quem está vacinado contamina menos, se infetado, e que a larga maioria das pessoas atualmente internadas, nos cuidados intensivos e das falecidas com covid não estavam vacinadas. Recentemente, eram 73% dos internados no Hospital de Santo António, e 89% dos mortos por covid entre os 50 e os 59 anos, existindo valores semelhantes em diferentes hospitais por este Mundo.
As pessoas que não querem vacinar-se deviam olhar para estes dados e pensar também naqueles a quem podem contaminar ou a quem podem tirar o lugar no hospital, adiar o tratamento de outras doenças, colocar em risco os profissionais de saúde, não esquecendo os recursos públicos despendidos por causa do seu negacionismo irresponsável.
Se mesmo assim o mantiverem, deviam ficar em casa, não frequentarem os espaços públicos, suspenderem-se do seu emprego, na medida em que ele exija interações.
Haverá algum risco na vacina? Admitindo até que sim, mesmo que não seja o que decorre da pseudociência das redes sociais, será um risco provavelmente inferior a muitos outros tratamentos que a medicina hoje nos disponibiliza. Por vezes, a escolha de os não aceitar apenas nos afeta a nós, como a quimioterapia numa doença oncológica. No caso da covid, porém, essa decisão pode ter graves consequências para os outros, a ponto de lhes tirar a vida.
Faz um ano que vacinámos o primeiro cidadão em Portugal. Depois disso, foi um esforço hercúleo para vacinar rapidamente o resto da população. Um esforço coletivo de quem organizou a operação, de quem administrou as vacinas, de quem com alguma ansiedade esperou a sua vez. Passado um ano, muitos cidadãos em outras partes do Mundo continuam ainda à espera da sua primeira dose e alguns já partiram, por não terem acesso a ela.
Em nome de todos eles, convém recordar que a liberdade individual de não se vacinar termina onde ela colide com a liberdade dos outros e com o seu direito à saúde e à segurança de todos.
*Eurodeputada do PS