Sinceramente, desejo muito que a classe política - deputados, ministros, todos - esteja a dormir mal. Se assim for, será um bom sinal. Sinal de que ainda se afligem com o rumo que as coisas estão a levar.
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O que se passou na sexta-feira no Parlamento é demasiado grave para ser verdade e não augura nada de bom para o nosso futuro. Um mês depois de o Governo ter tomado posse - mais bem dito: apenas um mês depois de o Governo ter tomado posse - a Oposição impediu em bloco a aprovação do Código Contributivo e aprovou uma série de outras medidas que têm um impacto pesadíssimo nas contas públicas.
O Governo fala - com razão - em ingovernabilidade, mas o que deve espantar o cidadão comum é a incapacidade de, em plena crise, os grupos parlamentares não se terem entendido e terem optado por um "tudo ou nada" que deu no que deu. De repente, o Governo fica com mais despesa e menos receitas, aparentemente em nome da humilhação a que a Oposição o quis sujeitar e de algum modo também em nome da recusa de negociação de que o partido de Governo vem dando mostra.
É preciso dizer que no caso em apreço se percebe pior a posição das diversas oposições, estranhamente unidas não por propósitos comuns mas apenas por um bota-abaixismo destinado a provar que no Parlamento a maioria não é já do Governo.
É certo que o Governo e o PS deram sinais de algum entendimento com a Oposição em matéria de Educação e Saúde - nestas áreas claramente. Mas esses sinais não foram extensíveis a outras áreas da governação, nomeadamente no que se refere às grandes obras - TGV, novo aeroporto e nova travessia do Tejo - onde é claro desde a campanha eleitoral que tem de haver negociações entre os partidos. A nomeação de alguns governadores civis mais parecendo prémios de consolação política também não foi, na semana que finda, um bom sinal da saúde política promovida pelo Governo.
Resulta de tudo isto um claro défice de responsabilidade. É evidente que se as relações entre partidos continuarem como estão e as votações no Parlamento impuserem ao Governo um programa e um rumo que não são os seus depressa desembocaremos em nova chamada às urnas. Independentemente de quem vier a ganhar as eleições - e até tudo pode ficar na mesma - a irresponsabilidade é a falta de entendimento. Os nossos políticos não só não são capazes de encontrar soluções para a crise como ainda a agravam. Até quando?