Foi uma festarola à maneira, a do centenário do 5 de Outubro. Quando o país se dedica a abrir as páginas da História, com exercícios cheios de "foi porrreiro, pá!", tende a esquecer as agruras do quotidiano. O registo de uma mão-cheia de episódios do dia em que se evocou a queda da Monarquia ajuda a perceber quão propício foi a gestos de "concórdia nacional".
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Com a aprovação do Orçamento de Estado para 2011 subentendida, Cavaco Silva lançou um apelo ao compromisso. O recado tinha dois óbvios destinatários - o chefe do Governo e o do maior partido da Oposição. Contudo, José Sócrates conseguiu passar o dia inteirinho sem comentar publicamente o que ouvira. E a Passos Coelho só faltou dizer "não é nada comigo", acabando ontem por introduzir mais uma pitada de dramatização num folhetim que promete prolongar-se.
Pois é, senhor presidente. Ficou-lhe bem a exortação à concórdia nacional. Valeu pelo derradeiro esforço, mas mais não pode fazer; quem decide são os partidos. A República, sendo "ética de responsabilidade", não dispensa a "crispação", da qual a seus olhos nunca brota coisa útil. Porque, embora responsabilidade rime com unanimidade, não são sinónimos, como aliás reconheceu no seu discurso.
José Sócrates não teve tempo para comentar o discurso presidencial, mas teve tempo para ir à missa. Não por acaso, 100 anos após o período dos "mata-frades", um primeiro--ministro inaugurou um templo católico. Não por acaso, falou de laicidade, de um Estado republicano que "não é anti--religioso"; trata "todas as religiões com igual respeito". No caso, o que isso significou foi um terreno cedido pela Câmara e um altar oferecido pela Junta de Freguesia. Viva a laicidade! E, já agora, a concórdia nacional.
A partir de Guimarães, Duarte Pio de Bragança perfilou-se como apoiante n.º 1 de uma recandidatura de Cavaco Silva, cujo desempenho classifica de "excelente". Aí está: nada melhor do que um pretendente ao trono a elogiar um presidente da República para garantir a concórdia nacional.