<p>O país atingiu a mais alta taxa de desemprego dos últimos 23 anos, fez ontem saber o Instituto Nacional de Estatística (INE). Por junto, são já mais de 500 mil os portugueses que não têm emprego (destes, cerca de 140 mil não têm direito, por não possuírem carreira contributiva, a subsídio de desemprego). Soma-se mais um facto histórico a esta tragédia: pela primeira vez, há mais homens sem trabalho do que mulheres. </p>
Corpo do artigo
Isto, que entristece qualquer mortal, caiu como ginjas na agenda da Oposição. Recordemos: anteontem, Sócrates foi à Lua quando soube que a riqueza produzida em Portugal subiu uns parcos 0,3% no segundo trimestre do ano, relativamente ao primeiros três meses do ano. Ao fim de tanto tormento, uma fatia de ar fresco permitiu-lhe fechar os olhos e disparar: "estes números marcam uma viragem na economia portuguesa".
Marcam mesmo? Não marcam. Oiçamos o ministro das Finanças: para que a crise acabe, "o crescimento económico deve manter-se de forma sustentada e reflectir-se na criação de emprego" (declarações à edição de ontem do "Diário Económico). Ou seja: o espasmo de alegria de Sócrates, não partilhado por Teixeira dos Santos, durou 24 horas. Teve um dia sim, logo seguido de um dia não.
Expurgando a política desta realidade, o que sobra? Sobra o óbvio: há sinais de recuperação em algumas economias (antecipados, de resto, pelas boas performances das Bolsas), mas isso não significa, longe disso, que o mercado de trabalho esteja a rejuvenescer. Infelizmente, sucede o contrário: como sempre acontece, há um espaço de nove a 12 meses entre a recuperação económica sustentada e o seu reflexo na criação de postos de trabalho. Ou seja: o desemprego vai continuar a subir, e muito provavelmente chegará aos dois dígitos em Portugal.
É por isso que não vale a pena perder muito tempo a ouvir a Oposição a apontar culpas ao Governo. Ou o Governo a dizer que o aumento é inferior aos anteriores, Todos sabem que, independentemente dos esforços que Sócrates faça e das almofadas que arranje para os mais expostos à crise, não há, no curto prazo, forma de travar a escalada do desemprego. Dói e vai continuar a doer.
Porventura, a discussão mais relevante a ter nesta altura é sobre a estrutura do mercado de trabalho português pós-crise. Parece já evidente que, estancada a hemorragia, haverá grupos de pessoas e classes de trabalhadores que dificilmente encontrarão onde se encaixar. A qualificação, média ou alta, será um trunfo ainda mais decisivo do que é actualmente para se encontrar emprego. O que fazer com os que não têm possibilidade de lutar neste mercado feroz é uma dos mais sérios problemas que se colocará à economia nacional quando a tormenta finalmente amainar.