No gráfico, pode o leitor ver que temos um dos mais elevados graus de <i style="mso-bidi-font-style:
normal">centralismo orçamental </i>no conjunto dos países europeus da OCDE.Em Portugal, <b style="mso-bidi-font-weight:
normal">87% da despesa pública está centralizada</b>.
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Registemos o facto: foi pela mão do centralismo, pois, que chegámos ao colapso das finanças públicas de 2011. E interroguemo-nos. Como é que o Estado centralizado se revelou, afinal, um desmesurado gastador? Como é que o centralismo não impediu - ao invés, fomentou - a indisciplina financeira, o descontrolo, o despesismo, o défice, o endividamento, a insustentabilidade?
O Estado centralista é auto-reformável?
O centralismo tem sido sinónimo de despesismo. O Estado centralista precisa de uma reforma profunda. Dificilmente, porém, o Estado centralista se auto-reforma. Quando muito, o Estado passa de uma a outra forma de centralismo. Ora, esta longa tradição portuguesa, que é centrípeta e despesista, poderia mudar se o Reformador assumisse uma reforma estrutural do Estado orientada por princípios de subsidiariedade e vigilância. Seria uma outra filosofia da reforma, em que o Reformador veria na "descentralização política" e na contenção de gastos a sua grande motivação.
Se fosse bem feita, se fosse sujeita a apertado enquadramento legal e a bons controlos centrais (sim, digo centrais), se fosse dotada de instituições de qualidade, descentralizadas e centralizadas (sim, digo centralizadas), a "descentralização política" poderia revelar-se o melhor caminho para a reforma do Estado macrocéfalo e incontido que nos rege. É o caminho da "regionalização" que a Constituição manda, em vão, seguir há quase 40 anos.
A descentralização é despesista?
Sei que muita gente pensa que descentralizar é criar mais despesa, mas a minha mais firme convicção é que isso depende do modo de descentralizar. Defendo que não há boa descentralização política sem boas regras orçamentais e sem bons controlos centrais. Uma rigorosa e temível vigilância central é um aliado da "descentralização política", num quadro de regras europeias das finanças públicas. Regras que, aliás, convivem com o facto de quase todos os países da UE serem politicamente descentralizados aos níveis municipal e regional.
A vigilância central é, assim, um alicerce. Tentemos aprender com o passado. Quando a vigente "descentralização política" (municípios e regiões autónomas) derrapou financeiramente, a falha foi também, e antes de mais, das instituições de vigilância da República, que são "centrais". Foi o centro político e institucional da República, foi o seu sistema de justiça e foi a separação constitucional de poderes, quem teve falhas de efectividade nos mecanismos de controlo da despesa descentralizada.
A descentralização piora o uso dos recursos?
Respondo que não. É o contrário. Entendo que não háboa afectação de recursos públicos no território sem bons contra-balanços políticos. Não temos, no Continente, um contra-balanço orçamental à altura da poderosa Administração Central, nem das reivindicativas Regiões Autónomas. Aquela e estas são relativamente fortes perante todo o resto nacional que se encontra pulverizado na "descentralização municipal". Entre o nível municipal, por meritório que ele seja (e é), e o nível central, o território continental não tem voz política independente e audível, legitimada por eleições. Tem vozes nomeadas, ou um misto de vozes, não tem vozes eleitas pelos cidadãos. O nomeado depende do nomeador, numa relação essencialmente hierárquica. O eleito depende dos eleitores, numa relação essencialmente democrática. Se existissem as cinco "regiões" desenhadas para o Continente, certas despesas públicas seriam muito mais escrutinadas e talvez fossem mais travadas. O poder central seria interpelado pelos poderes regionais, e todos entre si, por causa da boa, má, péssima afectação dos recursos escassos. De que, infelizmente, temos demasiados exemplos.
Além dos contra-balanços, há a razão da descontinuidade institucional e democrática entre a visão central e a visão local. Sem "regiões", perde-se justeza e sensibilidade. É mais um corolário do princípio da subsidiariedade.