<p>1. A anunciada fusão entre a Associação Empresarial de Portugal (AEP) e a Associação Industrial Portuguesa (AIP) ainda é uma história mal contada. Sendo que o que já se sabe assenta em dois equívocos. O primeiro é o de que os patrões têm de falar a uma só voz. Estranho argumento que, a ser levado à prática noutros sectores e actividades do país, nos conduziria, aí sim, para a "asfixia democrática". Poderíamos sempre defender, a seguir, a criação de uma central sindical única, porque há toda a vantagem em que os trabalhadores falem a uma só voz; e evoluir, depois, para um regime de partido único, para que todo o país falasse a uma só voz. Bastaria um a pensar e a falar por todos. Como pelos vistos pretendem os patrões.</p>
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O segundo equívoco, mais grave, porque é para levar mais a sério, é o de que, falando a uma só voz, a voz dos patrões tem de estar bem instalada em Lisboa. Para citar o presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários, Francisco Balsemão, "o diálogo institucional sai beneficiado com a proximidade dos centros de decisão". Resumindo, e seguindo esta brilhante linha de pensamento, a mesma que conduziu à anunciada fusão, em vez de lutarmos contra o centralismo quase fascista que se instalou em Portugal, devemos render-nos de vez às evidências e ao facilitismo e mudarmo-nos todos para a capital de armas e bagagens. Porque é mais fácil tratar de qualquer problema, seja ele empresarial, de saúde, laboral, autárquico, cultural, social, se estivermos próximo dos centros de decisão. Que estão na capital. Que belo país teríamos. Finalmente o sonho concretizado: o país seria Lisboa, o resto paisagem.
2. José Sócrates já foi eleito como um dos governantes mais bem vestidos do Mundo. Mas isso foi antes das últimas eleições legislativas e de se ter visto na contingência de trocar de fato. Confrontado com a maioria relativa na Assembleia da República, Sócrates teve de ir a correr comprar diálogo ao pronto-a--vestir mais próximo. O problema é que, por mais que o vista, salta à vista que não lhe assenta bem. E que o próprio se sente desconfortável. A melhor prova disso deram-na os Gato Fedorento que, durante a semana passada, foram contando as dezenas de vezes em que o velho e novo primeiro--ministro foi repetindo o substantivo. Com a provável expectativa de que, repetindo muitas vezes, se tornasse mais credível.
O problema de Sócrates, como aliás de todos os líderes da Oposição, é que o diálogo que praticam é de surdos. Ou seja, eu dialogo, mas só até tu te convenceres que os meus argumentos são melhores do que os teus e apoiares o meu ponto de vista sem reservas. Se assim não for, é porque não queres dialogar. Não é um cenário animador mas, quem sabe?, pode ser que com alguma cerzidura se vá corrigindo os defeitos do fato e que os partidos, todos, sem perderem a sua identidade, demonstrem alguma flexibilidade. Não acontecendo, lá voltaremos a eleições dentro de dois anos, quando terminar o ciclo eleitoral para a Presidência da República.