A época dos grandes festivais de verão chegou ao fim e o balanço, mesmo em ano de crise, aparenta ser positivo. O encerramento da temporada, na madrugada de ontem em Paredes de Coura, foi apoteótico. E não o foi apenas pelo regresso aos palcos, após mais de uma década de ausência, dos portuenses Ornatos Violeta, banda cujo culto ainda não é generalizadamente entendível.
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No anfiteatro natural da praia fluvial do Taboão assistiu-se, pela vigésima vez, a uma demonstração do que o interior de Portugal é capaz de oferecer quando teima em fazer bem e sem a obsessão de deslocar valor para a grande cidade. Em Paredes de Coura isso acontece há duas décadas, através da realização de um festival de música, para amantes de música, sem adendas ou parques de diversões, que atrai, dessa forma, público de todo o país e da vizinha Galiza em busca de uma oferta musical que contraria as tendências 'mainstream' do mercado mesmo quando, como aconteceu este ano, o cartaz do festival se apresenta praticamente desprovido de grandes nomes.
Durante cinco dias, o tal festival de música que se realiza numa pequena vila do Alto Minho sem qualquer ligação direta à autoestrada, com um tecido industrial diminuto, uma oferta turística que vai pouco além do ar puro e uma capacidade muito reduzida de fixação de juventude no concelho, chamou até si mais de 80 mil pessoas (números dos organizadores). Um público de heróicos resistentes ao verdadeiro dilúvio que no início da semana ameaçava abalar o sucesso da edição de aniversário. Mas se é certo que (quase) não há festival em Paredes de Coura sem chuva, não é menos verdade que ele também não existe sem gente feliz. Pessoas de todas as idades que, segundo estudos recentes, compõem a faixa etária entre os 15 e os 64 anos que assistem a festivais de música, os eventos culturais que mais público atraem entre nós.
Coura, no entanto, está longe dos gabinetes de marketing das grandes empresas, mesmo daquelas que patrocinam a música quando dela pensam retirar dividendos sem margem de risco. Ou seja: desde que se realizem em Lisboa ou Porto. É, também nesta área, uma visão desfocada do país que tem mantido o festival de Paredes de Coura numa intermitência de 'naming sponsors' de peso (nesta edição foi a vez da EDP apoiar o evento) ano após ano.
Pela nossa parte, continuaremos a promover o concurso de bandas JN que, este ano, levou a um dos três palcos do festival seis grupos emergentes que puderam mostrar quanto valiam a uma plateia numerosa e generosa. E continuaremos a fazê-lo enquanto Paredes de Coura fizer o que tem feito nestas duas décadas de estreias nacionais (trouxe pela primeira vez a Portugal bandas como Coldplay ou Arcade Fire, entre muitas outras) e música alternativa: um festival bem feito, para muitos de culto, e que está nos antípodas do desprezo pelo interior do país.