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A Entidade Reguladora da Saúde deliberou, a 6/02/2015, abrir, e bem, o processo de inquérito ERS/004 /2015, devido às notícias da Comunicação Social que indicavam a ausência de equipas de neurorradiologia de intervenção e de neurocirurgia vascular no Hospital de S. José/CHLC aos fins de semana, com prejuízo dos doentes.
Agora que já são do conhecimento público algumas das consequências fatais das falhas destas escalas, é chocante que, com uma mera, sofrível e tecnicamente discutível recomendação de transferência destes doentes, a ERS tenha decidido o singelo arquivamento do processo, com a estranha conclusão que "não resulta provado" que o CHLC "tenha violado os direitos e interesses legítimos dos utentes, designadamente o direito de acesso dos cidadãos aos cuidados de Saúde no âmbito do SNS"! Como não?!
Contrariando os dados factuais apurados no inquérito, a ERS branqueou os procedimentos que culminaram na morte de várias doentes, violou os seus próprios Estatutos, que a obrigam a garantir o direito dos cidadãos de acesso a cuidados de saúde com qualidade, e demonstrou, mais uma vez, a pobreza da regulação em Portugal.
Mesmo com atrasos, que significavam pouco empenho, pois continuava a prevalecer o desiderato maior de "poupar" alguns euros sem cuidar das consequências, em abril de 2015 já existia um acordo entre o Conselho de Administração (CA) e as equipas, aguardando-se a aprovação da tutela. A ERS evita responsabilizar o CA e o Ministério por estes atrasos.
O CA afirmou que a via verde do AVC sempre "funcionou em pleno e ininterruptamente" no Hospital de S. José. É uma afirmação falsa, pois sem neurorradiologia de intervenção e sem neurocirurgia vascular é impossível afirmar que a via verde do AVC funcionou "em pleno"! Morreram doentes, outros ficaram com sequelas, quer por aneurisma roto quer por AVC isquémico, mas o CA e a ERS acharam tudo normal.
Perante a estatística dos aneurismas rotos anteriormente operados ao fim de semana, a ERS nem sequer teve o interesse de perguntar o que aconteceu concretamente aos doentes que deixaram de ser operados atempadamente depois da suspensão das escalas...
Este inquérito da ERS foi uma ocasião perdida para resolver oportunamente a grave lacuna de atendimento dos AVC hemorrágicos ou isquémicos na Grande Lisboa, aos fins de semana.
Perante estas óbvias insuficiências da regulação, resta aos profissionais de saúde e aos doentes denunciarem à Comunicação Social todas as situações de falhas de atendimento nos serviços de saúde, seja ela pública, privada ou social, pois problemas existem em todos os setores.
Para bem dos doentes, a Ordem dos Médicos deveria ser autorizada a fazer auditorias clínicas às instituições de saúde. Estamos disponíveis para colaborar com a ERS.