Como as costas dele andavam piores que o chapéu de um trolha, o médico proibiu-o de voar até ao outro lado do Mundo para acompanhar a independência de Timor e a visita à Austrália de Sampaio. O azar do Henrique foi a minha sorte. Estava ali à mão, a editar a Revista do "Expresso", e fui escolhido para o substituir nessa bela viagem.
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Timor também teve sorte. Se o massacre no cemitério de Santa Cruz não tivesse sido filmado, e se não tivessem vindo cá para fora as imagens dos militares indonésios a assassinarem 271 timorenses, o mais certo é que ainda fosse uma província indonésia.
O impacto daquelas imagens chocou o Mundo e gerou um incrível alinhamento de estrelas - Clinton (e não Bush) na Casa Branca, o fluente em Inglês Sampaio (e não Cavaco) em Belém, o Nobel da Paz para Ramos Horta e D. Ximenes Belo, a sagração de Xanana como um novo Che, etc. - que possibilitaram o milagre da independência.
A sorte e o azar são independentes da bondade das causas e do talento das pessoas. Dido é talentosa (aos seis anos era exímia no piano e violino), mas durante dois anos ninguém ligou a "No angel", o seu primeiro álbum, que só não foi o único porque no entretanto o tema "Thank you" foi incluído por Eminem no seu mega hit "Stan" - e desencadeou uma curiosidade tal por aquela voz doce e que cantava uma melodia suave que o disco de estreia da cantora britânica teve de ser reeditado e acabou por ser o mais vendido (12 milhões de cópias) de 2001.
Durão Barroso também pode ser talentoso, mas anda sempre com um trevo de quatro folhas no bolso. Acedeu à galeria do cavaquismo por obra do tio Diamantino, que teve passagem de cometa pelo Ministério da Educação. Perder com Nogueira no congresso da sucessão poupou-o a ser a cara da derrota após uma década laranja. Emergiu da reserva num timing que parecia errado, mas acabou por ser o certo porque Guterres borregou e entregou-lhe o Governo de mão beijada. Quando na frente interna as coisas estavam a dar para o torto, agarrou a oportunidade de bazar para Bruxelas. É um Gastão.
Seguro aparenta ser um Peninha. Aos olhos de quem o vê na televisão e lê nos jornais, parece um homem sem qualidades para o cargo, que o que faz é determinado pelas circunstâncias, não pelo caráter, e que o que diz é ditado pela vontade de capitalizar os descontentamentos, não pelo programa - outra explicação não arranjo para prometer reabrir todos os tribunais, restaurar todas as freguesias e acabar com todos os cortes e aumentos de impostos (só lhe falta prometer ressuscitar todos os portugueses mortos desde o chumbo do PEC IV).
Quando as sondagens anunciaram que as europeias estão em aberto e as pressões internas se tornaram sufocantes, as estruturas do PS receberam um email do Rato a comunicar-lhes que o Seguro não estava assustado. Valha-nos Deus!
Como sorte e azar são independentes do talento, Seguro até pode revelar-se um Gastão. Se ganhar as europeias, fica com via verde para S. Bento. Mas para o país é melhor que seja um Peninha - e que a 25 de maio as urnas deem ao PS um líder com drive, com a força de gravitação que leve o partido, agora, e o Governo, depois, na direção certa.