Todos ficaríamos mais descansados se soubéssemos que se está apenas a discutir a problemática da saúde local, e que o assunto não é aproveitado nem para a guerra política nem para a vantagem de corporações
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Não é fácil ter uma opinião fundamentada sobre o encerramento nocturno de urgências hospitalares. Ouvidas as populações, a decisão do Governo soa a brutal: nalguns pontos do país, adoecer durante a noite pode ser trágico, pois obriga a recorrer ao automóvel até ao hospital mais próximo ou a chamar uma ambulância que faça o transporte do doente. O Governo disponibilizou ambulâncias SIV (com suporte imediato de vida), mas há autarcas de municípios onde a ambulância já está instalada que dizem que isso é pouco. Será?
Vistas as coisas pelo lado do Governo, a medida compreende-se. Em primeiro lugar porque só é aplicada quando não há grande número de urgências (em Valença fala-se em duas); há casos onde mesmo assim se mantém a urgência porque os acessos ao hospital mais próximo são maus - caso de Pampilhosa da Serra. Há, claramente, uma impossibilidade de cada um de nós ter um hospital ao pé da porta. Porque é caro montar um bom hospital. Porque o médico que fizer urgência nocturna vai fazer falta no dia seguinte na consulta. Custará às populações abrangidas aceitar que assim seja, mas a verdade é que um doente de Leça da Palmeira ou de Loures também não tem o hospital ao fim da rua. E é preciso também explicar que a abertura de um SAP não garante, por si só, qualidade no atendimento.
Tudo visto e pesado, aconselhar-se-ia mais diálogo e maior envolvimento, se possível dos autarcas locais e dos dirigentes partidários locais. A começar pela ministra. Ana Jorge, que iniciou o mandato dando a cara onde o seu antecessor tinha perdido a face, não pode, agora, remeter-se às quatro paredes do seu gabinete. E também o pessoal médico e paramédico. Mais uma vez, o que está em causa é sabermos se podemos pagar o Serviço Nacional de Saúde tal como ele foi idealizado. O que está em causa é compreendermos se há alguma racionalidade nos cortes que estão a ser feitos. Todos ficaríamos mais descansados se soubéssemos que se está apenas a discutir a problemática da saúde local e que o assunto não é aproveitado nem para a guerra política nem para vantagem de corporações.