São poucos estes caracteres de que disponho para escrever sobre um tema que, de há muito, me tem preocupado. Falo, naturalmente, do centralismo que, como prognostiquei em 2009, no meu livro "Uma questão de caracter" se iria, inevitavelmente, exacerbar com a crise.
Corpo do artigo
Sucedem-se os governos e a cada um que chega, atribuímos-lhe o título de campeão do centralismo, para logo ser derrotado, nessa competição, pelo Governo que se segue.
Tudo isto porque o Estado exíguo não tem outra alternativa que não seja a concentração dos recursos cada vez mais escassos nas imediações do Terreiro do Passo. Em Portugal, sinergia sempre teve, como sinónimo, a concentração na capital.
Tudo isto se torna possível, naturalmente, porque o nosso sistema político, dominado pelos diretórios partidários, obedece a uma lógica perversa. Razão pela qual o PS do Porto reclama hoje, quando antes se calava. Razão pela qual o PSD do Porto se cala hoje, enquanto há dois anos reclamava.
Dir-se-á que, apesar de tudo, a cidade do Porto tem menos razão de queixa do que o interior deserdado, o que não deixa de ser verdade. Mas num País bipolar, a destruição dos centros de competência na segunda cidade tem um significado político evidente, e um impacto intolerável.
Para o Metro do Porto, não se conhece nenhuma solução. A CCDRN remeteu-se ao silêncio, enquanto o QREN vai sendo desviado para Lisboa e Vale do Tejo, ao abrigo do "spill over", uma batota inventada. Entretanto, e nos últimos meses, o Governo anunciou o fim da agência Lusa no Porto. Com isso, deixamos de ser notícia. A RTP transfere a "Praça da Alegria" para Lisboa. Com isso, a nossa cultura popular desaparece dos écrans. O aeroporto será privatizado juntamente com a ANA, para resolver os problemas do "hub" de Lisboa e para viabilizar a eventual construção de um novo aeroporto da capital, como foi referido, de forma ostensiva, na deliberação do Governo. Apesar das promessas, a Junta Metropolitana foi olimpicamente ignorada, e o nosso aeroporto foi tratado como parte do enxoval. O porto de Leixões esteve para ser fundido com os outros portos, um processo que foi suspenso, apenas, porque os estivadores dos outros portos entraram em greve. Não foi nomeado um novo Conselho de Administração da APDL, o que quer dizer que, logo que os problemas laborais de Lisboa estejam resolvidos, o processo de fusão vai ser retomado. O IHRU deixou de cumprir os compromissos assumidos com a Camara Municipal do Porto, o que congela a reabilitação dos bairros sociais, e trata de inviabilizar a Sociedade de Reabilitação Urbana, ao não assumir as suas promessas. Serralves terá de viver com um corte orçamental profundo e, na Casa da Musica, o Governo foi mais longe, faltando ao prometido e obrigando o seu Conselho de Administração a demitir-se, esquecendo que, dessa forma, afastará os mais importantes mecenas. Se o Estado não cumpre as suas promessas, como podem os privados, a contas com tantas dificuldades, assumir os seus compromissos?
Este ataque sem precedentes vem sendo tolerado a troco de um conjunto de promessas ocas e demagógicas. A propósito da fusão dos portos, garantem-nos que a futura "holding" poderá ter sede no Porto; a propósito da RTP, prometem-nos centros de produção de conteúdos no Monte da Virgem; a propósito do aeroporto, garantem-nos que iremos ser, apesar disso, o maior destino turístico da Europa. Entretanto, a comunicação social local e regional vai sendo silenciada, o que quer dizer que, em breve, serão os diretórios a definir quem pode usar a palavra. E, assim, inexoravelmente, a nossa cidade estará condenada a irrelevância.
Esse destino que nos vão apontando pode, ainda, ser contrariado. Sucederá, apenas, se não houver quem tenha coragem para falar claro e representar o povo do Porto, defendendo, com tenacidade, tudo aquilo que é nosso, e por direito próprio. Mais vale tarde do que nunca, e chegou o tempo de agir. Sim, este vai ter de ser um inverno quente.