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Quando aceitou a renúncia ao cargo do ainda primeiro-ministro António Costa e convocou eleições, Marcelo Rebelo de Sousa fê-lo para gerar um Governo que fosse garantia de “estabilidade e progresso económico”. Optou por dissolver o Parlamento em vez de nomear um novo primeiro-ministro saído da maioria absoluta socialista. Cinco meses depois, chegamos aqui. Os desígnios de Belém saíram completamente gorados. E em vez de estabilidade, estamos perante um dos cenários de maior instabilidade na nossa democracia, nos 50 anos do 25 de Abril. Ao contrário de muitos prognósticos, a AD não conseguiu vitória esmagadora, e a derrota do PS está longe de ser humilhante. Tivemos um quase empate, com o Chega a servir de ponto de equilíbrio.
Como tudo indica, Luís Montenegro irá honrar a sua palavra de “não é não”, dispensando o Chega. Pedro Nuno Santos deverá assumir o papel de líder da Oposição. Assim, a AD encontra-se na difícil situação de governar a prazo.
Veremos se o que acontecerá daqui para a frente terá força suficiente, capaz de, no próximo ato eleitoral, travar o crescimento do Chega, partido de extrema-direita.
Entre os mais de um milhão e cem mil portugueses que votaram em André Ventura - fazendo com que o partido que lidera quadruplicasse a votação, passando de 12 para 48 deputados - não serão, por certo, todos saudosistas da ditadura fascista, nem todos defendem a castração química para os violadores, nem todos desrespeitam as mulheres, os homossexuais, os ciganos e os imigrantes. Nem todos, talvez, acreditem no país de corruptos e que acabando com os subsídios, aos que “não querem trabalhar”, tudo se resolverá.
Recuso acreditar que um em cada cinco portugueses tenha um pensamento tão primário. Muitos deles, creio, perderam a esperança. Por culpa dos que nos têm até agora governado e, ontem, praticamente empataram. Cabe-lhes agora reconquistá-los e fazer de Portugal um país decente.