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Na antecâmara destas próximas eleições, por parte de muitas personalidades da dita "inteligência" nacional e de reconhecidas elites, de cores partidárias diversas, inclusive, algumas provindas do próprio PS, vem sendo defendida a tese de que qual seja o resultado dessas eleições, José Sócrates fique de fora. O argumento é simples: Sócrates faz parte do problema e não da solução.
É típico dos comportamentos colectivos ou individuais, quando assolados pela desgraça, como esta de um país falido, para recompor a dor e o desespero que nos vão na alma, procurar projectar num identificado "bode expiatório", a razão da dita tragédia. Não digo que Sócrates não tenha grande quota-parte neste afundamento da situação endividada do país. Pelas políticas seguidas. Pela sua estratégia fatal de que nunca se pode dizer ao povo de que já estamos no fundo. Por ser a primeira vítima de um marketing político falhado que lhe ensinaram de que, em política, o segredo é esconder a verdade, pois, as falácias sempre inebriam mais o povo, avesso à dureza da verdade. Pelo equívoco sustentado de que uma Europa solidária viria "salvar" a pátria lusitana. Mas continuo a pensar que esta condenação exclusiva sobre Sócrates é não só injusta como perigosa. Perigosa para a nossa recuperação. É preciso não esquecer que a nossa dívida externa privada é superior à do Estado. É preciso identificar outros responsáveis, como os bancos, determinados empresários e tantos cidadãos que não será por "matar" Sócrates que se regenerarão para saber viver dentro das suas possibilidades. Nem se esqueça a forma como certos grupos, possuídos de um corporativismo vesgo, sempre se opuseram às reformas.
Mas, voltando à ideia inicial, o que me parece é que essa "inteligência" que põe antecipadamente de fora Sócrates ou esses líderes que juram com ele não formar governo, esquecem um pequeno pormenor: em democracia, o voto de cada cidadão vale o mesmo. No último concurso da canção para a Eurovisão, promovido pela RTP, enquanto em cada distrito do país votavam os júris, compostos de "experts" na matéria, "Os Homens da Luta" estavam no fim da tabela. Vieram os 50% do voto popular e "Os Homens da Luta" galgaram para o primeiro lugar. Pense-se o que se pensar da "orquestração" do congresso do PS, Sócrates venceu. Num país em que, por contas do insuspeitável Medina Carreira, 6 milhões de portugueses dependem do Estado, a relação com o "patrão acidental", o Governo, tem muito de amor e ódio. Em democracia, o voto é popular. E o povo nem sempre faz a vontade às elites.