<p>Alguém já o disse: a revelação de documentos secretos e confidenciais do Departamento de Estado norte-americano pelo site WikiLeaks foi "o 11 de Setembro da diplomacia". Atentas as reacções, a afirmação talvez seja exagerada. A diplomacia quer-se discreta, para ser eficaz. Se as portas se escancaram, descobrem-se carecas. Mas como não há quem não tenha esqueletos no armário, todos se apressaram a pôr água na fervura, jurando a Washington que nada mudará nas suas relações com outros estados.</p>
Corpo do artigo
Se os efeitos políticos ainda estão por avaliar em toda a sua dimensão, é já possível perceber que o caso é uma "bomba" para o Jornalismo, não podendo deixar de o interpelar.
Duas questões devem ser previamente removidas, antes de discutir a negociação entre o Wikileaks e cinco dos mais reputados jornais do mundo. A saber: a legalidade da revelação dos documentos pelo site e as motivações de Julian Assange, o seu promotor. Nenhuma delas deve ser considerada, a partir do momento em que os responsáveis editoriais assumem que se trata de matérias de interesse público. Há nisso, porém, uma "contrapartida": a responsabilidade transfere-se para quem aceita acolher as informações nas suas páginas.
É aqui que bate o ponto. Admitindo que os jornalistas não se rendem à irresponsável ideia de que o que está escondido deve, por isso mesmo, ser revelado (que nada tem a ver com transparência), outras questões se levantam. Persiste a dúvida sobre se têm condições para um efectivo escrutínio do material fornecido e, já agora, vontade de separar o trigo do joio.
Os documentos em causa não passam de fragmentos da realidade, seleccionados por outrém. Contêm informações não confirmáveis, citam fontes que nem sempre podem apresentar a sua versão dos factos. E incluem, aparentemente, muita parra e alguma uva, no que ao interesse jornalístico concerne.
Entre a "parra", as "festas selvagens" de Berlusconi, um Medvedev pau-mandado de Putin e um Sarkozy que mina a política externa dos Estados Unidos - todas grandes "novidades". Do lado da "uva", a "espionagem" ao secretário-geral da ONU, para já a mais embaraçosa das revelações.