Leia-se a obra ficcional de David Lodge e aí fica-se a conhecer parte do mundo académico. Num dos seus romances, "O Mundo é pequeno", encontramos professores universitários saltando de aeroporto em aeroporto, de congresso em congresso, de cama em cama, alimentando um real que é só deles, feito de múltiplas relações ilícitas. Profissionais e afetivas. Umas e outras cruzam-se e influenciam-se em permanência, provocando verdadeiros tsunamis silenciosos dentro da Academia.
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Quem trabalha nas universidades conhece bem este pequeno mundo onde frequentemente a progressão na carreira se faz à custa de favores e de proteções que privilegiam aqueles que são mais submissos ou mais engenhosos na arte da ilicitude. Uma das formas de travar alguns abusos seria criar novos procedimentos nos diversos concursos que as universidades promovem. Vejamos dois exemplos.
Júris para admissão de novos professores. Há quem sugira que uma forma de garantir alguma independência no corpo docente seria impedir os doutorados de concorrerem a vagas abertas pela universidade que os formou. Num país tão pequeno como o nosso, essa não seria uma prática justa. No entanto, poder-se-ia criar um mecanismo de maior imparcialidade, se se retirassem dos júris os professores da instituição para a qual se seleciona um candidato.
Júris para progressão na carreira. Aí está um dos maiores calcanhares de Aquiles do Ensino Superior. Conhecendo previamente o júri da sua universidade (constituído sempre pelos catedráticos do seu campo científico), os professores de graus inferiores cedem, por vezes, à tentação de bajularem os colegas que decidem o ritmo a que irão progredir, muitas vezes pisando linhas vermelhas do eticamente aceitável. Eis aqui um verdadeiro sistema medieval que ninguém ousa discutir em público, embora seja um tópico presente nas conversas entre professores universitários. Uma das formas de atenuar abusos de poder e comportamentos reprováveis da parte de quem não conhece meios para atingir fins seria impor às universidades júris compostos apenas por elementos de outras instituições de Ensino Superior. Que não poderiam repetir-se no concurso seguinte. Não resolveria tudo, porque o grupo daqueles que decide é pequeno, mas ajudava a tornar respirável ambientes que, por vezes, se tornam demasiado poluídos nas bases.
A Universidade portuguesa carece hoje de uma reforma profunda. Que, embora difícil de fazer, é vital para que o Ensino Superior se renove.
* PROFESSORA ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UNIVERSIDADE DO MINHO