O programa de medidas do Governo dirigidas à habitação está longe de ser consensual e, até por isso mesmo, precisa de ser avaliado e discutido de forma séria e equilibrada.
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Ideologicamente, a proposta mexe numa área com reações antagónicas: o de quem defende maior regulação do Estado versus quem defende um mercado a seguir o seu caminho sem intervenções. Debaixo do teto europeu - que oscila, simplisticamente, entre diferentes níveis de social-democracia e de liberalismo -, as medidas têm mesmo que ser equilibradas. E também olhadas dessa mesma forma.
Após anos em que, generalizadamente, se criticou a forma desregrada como cresceu o negócio do alojamento local num parque habitacional ao abandono, o anúncio de regras não pode ser recebido como se se tratasse de uma intervenção estatizante ao nível soviético.
Olhemos para o exemplo dinamarquês, que até se admite venha a ser seguido pela Irlanda: se o dono de uma habitação se muda e não a quer vender deve pelo menos alugá-la. Se a propriedade estiver vazia mais de seis semanas, o proprietário tem que o comunicar às autoridades locais, que ficam encarregadas de encontrar um inquilino que o proprietário tem que aceitar. Amesterdão é outro exemplo, com políticas semelhantes que penalizam os proprietários que deixam as propriedades sem ocupação.
Numa Europa de mercado aberto, nunca se ouviu que a Dinamarca ou os Países Baixos fossem países cuja intervenção prejudicasse o investimento económico e que o setor turístico estivesse sujeito a um espartilho estatal.
Nesta fase da discussão não faz qualquer sentido acusar o Governo de colocar em causa a propriedade privada, mas esse mesmo Governo não pode deixar-se cegar pela convicção de que vai conseguir, com um pacote legislativo, equilibrar um setor que durante décadas mostrou estar ao abandono.
*Editor-executivo adjunto