1 A notícia, sorrateira, quase passou despercebida. Os CTT tinham sido autorizados a aumentar os seus preços a partir do início de Abril. Até aqui nada de novo.
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Sectores regulados obedecem a este mecanismo: com uma certa periodicidade, a evolução dos respectivos custos é analisada e, em conformidade, há, ou não, a autorização para que a mesma seja repercutida, em parte ou no todo, nos clientes. Pode-se discutir se, em recessão, o quadro regulatório não deveria ser ajustado para, de algum modo, sujeitar estes sectores ao mesmo "sentimento" que experimentam as outras atividades expostas ao mercado. Ou seja, causa estranheza que a estes sectores seja permitido o aumento dos preços quando, em muitos outros, a sobrevivência exige a sua contenção ou, até, descida: afinal a deflação há-de ter alguma origem... Ainda assim, o que, neste caso, me chamou a atenção foi a justificação: para além de uma tecnicalidade (efeito da diminuição da procura) repercutem-se, diz-se no comunicado, os aumentos dos custos com os combustíveis e com os transportes. Julguei haver lido que, em 2013, os preços dos combustíveis se tinham mantido estáveis. Fui confirmar. Confirmei! Fiquei com a dúvida se, quem compra combustíveis para os CTT, compra bem e se o regulador fez as perguntas que devia. Só dúvidas. As certezas decorrem do texto do comunicado da empresa: com este aumento, "actualização" na linguagem asséptica, o tarifário dos CTT sobe, em média, 4% durante 2014. Leu bem: 4%! E há mais: como 95% do negócio é feito com as empresas, o "impacto é negligenciável na economia das famílias". De onde se conclui que os CTT assumem, num raciocínio peculiar, que as restantes empresas e instituições não repercutirão este aumento para os seus clientes. Os CTT, coitados, têm de repercutir o aumento dos combustíveis... que não ocorreu. Mas as outras empresas, não farão o mesmo com os aumentos dos "correios". Talvez por estarem sujeitas às regras da concorrência venham a engolir o acréscimo de custo. Ou não! E, então, adivinhe quem paga. Lembrei-me, então, que um grande cliente dos CTT hão-de ser as Finanças: mais um pretexto, quando esses nem de pretextos precisam. Resumindo: façam lá os aumentos mas não percam tempo com explicações. É que pode ser pior a explicação que o soneto, perdão, o aumento.
2 A outra notícia, pelo contrário, teve grande visibilidade. Refiro-me ao inquérito do INE sobre as condições de vida e rendimentos dos portugueses em 2012. Os desempregados e, entre eles, os de longa duração e idade superior a 50 anos, emergem como o grupo mais castigado, no seu rendimento e na sua dignidade. Privado do acesso ao trabalho, este grupo tem sido ainda vítima maior das restrições introduzidas nos mecanismos de apoio aos desempregados. A probabilidade de voltarem ao mundo do trabalho é baixa, tanto mais baixa quanto menores forem as respectivas habilitações. É um dado adquirido, um daqueles casos em que, se nada for feito, se sabe o que vai suceder. A preocupação com a sua situação faz parte do discurso politicamente correcto, sem que tal tenha tido tradução em medidas apropriadas à sua condição. Neste terreno se joga, e testa, o que queremos ser como sociedade, as nossas prioridades e valores. Não é tarefa fácil. A requalificação é difícil para quem tem baixos níveis de qualificações e educação formal. O regresso ao passado não ocorrerá. O empreendedorismo é, neste caso, quase sempre um logro. E não é solução para todos. Prioritárias hão-de ser actividades onde a componente humana, a habilidade, a dedicação, o sentido de dever, o afecto sejam relevantes. Poderão ser actividades públicas, de proximidade, em que o poder local terá a palavra. Podem ser incentivos dados à iniciativa privada. O acompanhamento aos idosos, a companhia aos acamados e isolados, a gestão dos estacionamentos, a vigilância cívica, a organização dos espaços públicos. Assim haja vontade política. Como há para encontrar um "lugar de recuo" que, não poucas vezes, é um "chuto para cima", aos desempregados políticos, mesmo se têm mais de 50 anos ou usufruindo de generosa pensão.