A árvore: percebendo que uma vacina administrada à pessoa errada é uma notícia, insistir em não a enquadrar na realidade maior a que pertence é esbarrar de frente com o eucalipto e ficar cego.
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A floresta: o plano nacional de vacinação é consistente? Tem sofrido muitas alterações? Está logisticamente a correr bem? Ou seja, as vacinas chegam rapidamente e em bom estado aos locais de destino? Estão a conseguir identificar-se, sem problemas, os indivíduos em cada grupo alvo? Até agora, foram vacinados grupos fechados como os profissionais de saúde e os utentes e profissionais dos lares. Está tudo bem preparado para identificar os indivíduos dos grupos seguintes cada vez mais abertos? As doses de vacinas que nos cabem estão a chegar conforme planeado. Há informação transparente e atualizada sobre tudo isto? Como se tem passado tudo isto nos outros países ?
Deixo uma ponta do icebergue.
Na Alemanha, vai guerra aberta porque o país que criou a primeira vacina decidiu privilegiar o espaço europeu e pôr os seus cidadãos na fila. Em França, o processo é dos mais lentos da Europa. Requer-se por cada cidadão um consentimento por escrito em consulta médica, cinco dias antes da toma. Na Suécia, há uma desconfiança generalizada, porque em 2018 se lançou um programa de vacinação geral contra a gripe porcina e a maioria dos vacinados contraiu narcolepsia (doença do sono). Na Bélgica, os vacinados com a primeira dose souberam, depois da toma, que afinal não vão receber a segunda dose no prazo estipulado, porque o Governo decidiu vacinar o máximo número de pessoas possível, garantindo assim uma maior proteção parcial em termos globais. Isto para não falar na Rússia e na China, onde os cidadãos são vacinados maciçamente com vacinas sobre as quais não existe evidência científica conhecida no que respeita a segurança e eficácia.
Insistir na cegueira da pequena notícia é esquecer o verdadeiro milagre de uma vacina que se desenvolveu em tempo recorde e de uma das mais complexas operações logísticas de sempre à escala mundial que nos permite, no tempo certo, tê-la à mão ao virar da esquina.
*Analista financeira